NOVO CONTO (DE HORROR?) DO PACO

 

                   É bem conhecido o famoso Conto do Paco (CP), pelo qual, em tese, alguém engana alguém. Como o leitor poderá ver detalhes desse tipo de CP na Internet, vou me ater, neste artigo, a um novo tipo de CP: o Conto do Plano Privado (CPP) que, para mim, pelo menos, é novo e assustador. Ele se relaciona com as três maiores necessidades do HOMEM: aposentadoria, saúde e habitação. Neste artigo, vou narrar minha saga com esses três CPP.

                   Eis o início dessa narrativa. Nas décadas de 1980 e 1990, lidei com esses três CPP. Vejamos, inicialmente, dois deles: aposentadoria e saúde. Em seguida, falarei sobre o conto da habitação. Depois de pagar por muitos anos para uma determinada instituição privada que oferecia o benefício de aposentadoria, devolveram-me certo valor em dinheiro (talvez essa devolução estivesse escrita nas famosas letras miúdas do contrato por mim recebido e não lido), e que eu deveria declarar a soma no meu Imposto de Renda (IR). O documento que recebi daquela instituição, dizia: Natureza do Rendimento – Resgate de Previdência Privada e FAPI – Beneficiário Pessoa Física. Em vista disso, e por orientação da instituição em tela, declarei, em meu IR, no item PAGAMENTO E DOAÇÕES EFETUADOS, uma vez que é, neste item, onde devem ser declaradas as FAPI. (Aliás, isso também ocorre com as Universidades Federais, em que uma parte da aposentadoria é considerada como FAPI). Esse fato aconteceu na minha Declaração do IR de 2007, referente ao ano base de 2006. Em vista dessa  informação declarada, e considerando que possuo dois planos de saúde privados de uma mesma empresa ofertadora desse tipo de plano (mais tarde explicarei a razão de tal atitude aparentemente “insana”), naquele ano de 2007, eu teria uma devolução de imposto.

                   Alegre, por ser a primeira vez que iria receber uma devolução de IR (logo depois darei a razão de sempre pagar corretamente o IR), em junho de 2007, entrei na Internet para ver se meu nome já constava no primeiro lote de devolução de imposto. Eu tinha duas razões para acreditar nisso: primeiro, por ser idoso (71 anos, na época), e segundo, por haver entregue, em março, a declaração. Qual a minha surpresa: além de meu nome não estar nesse primeiro lote, havia a informação de que minha declaração estava na Base de Dados da Receita Federal (BDRF), que é um eufemismo para a seguinte expressão: você está na malha fina, pois há culpa ou dolo em sua declaração. Querendo saber mais, e ainda por indicação da Receita Federal em seu sítio (site), entrei em outro local, que então informou a razão da não inclusão do meu nome naquele lote: problemas com despesas médicas. Preocupado, fui ao Plantão da Receita Federal (PRF). O atendente usou o computador e confirmou o que eu já sabia: O senhor está na Base de Dados por questões relacionadas com suas despesas médicas. Quando lhe perguntei o que deveria fazer, sua resposta foi automática: O senhor deve aguardar a intimação da Receita! E essa história se repetiu até o último lote de devolução do ano de 2007. O ano de 2008 também se passou, com a mesma informação: meu nome continuava na malha fina e esperando ser intimado pela RF.

                   Depois que apresentei minha Declaração de Renda 2008/2009, conversando com um amigo sobre a minha situação pendente na RF, desde 2007, ele me aconselhou a não ir ao PRF, mas ir diretamente ao quarto andar do prédio da RF para ver o que estava acontecendo com o meu IR de 2006/2007. Lá, fui orientado para fazer uma retificação desse IR, pois eu havia cometido um engano: o dinheiro referido acima que recebi da aposentadoria privada deveria ser registrado no item: RENDIMENTOS TRIBUTÁVEIS RECEBIDOS DE PESSOAS JURÍDICAS PELO TITULAR. Feita essa retificação, agora com imposto a pagar (cerca de dez vezes maior do valor que iria receber), enviei-a para a RF. Passados alguns dias, fui ao PRF para ver o deveria fazer a fim de pagar o imposto referido. O atendente, bem solícito (aliás, engenheiro civil como eu), então me preparou um DARF que, por minha escolha, eu pagaria de uma única vez até 31 de março de 2009, o que realmente fiz. Como o “novo” imposto deveria ser pago no dia 30/04/2007, houve um acréscimo em torno de 42% do valor do imposto a pagar, em virtude de Multa e Juros e/ou Encargos. O leitor, nesta altura, deve se perguntar: Por que o articulista não parcelou em oito vezes? Claro que pensei nisso, porém, consultando o plantonista solícito, soube que, em cada mês, o acréscimo aumentaria mais ainda. Nesta altura, o paciente leitor não deve pensar que, apesar de minha providência antecipatória, resolvi esse problema. Não, pois continuo na malha fina por causa de divergências nas despesas médicas (conforme fui novamente informado) e, por isso, terei de voltar à RF, quando a minha declaração retificadora for examinada. Em tempo: quando estive no quarto andar vendo o IR 2006/2007, tive conhecimento que o meu IR 2007/2008, também está na malha fina, por supostas divergências nas minhas despesas médicas, muito embora tenha pago o imposto devido (indicado na minha DR), durante oito meses de 2008. Como ainda não fui intimado oficialmente pela RF (e por ocasião de minha referida visita ao quarto andar), fui informado de que, provavelmente, tais divergências sejam devidas à declaração do pagamento de um plano de saúde, cujo valor esteja acima (suponho eu) de um determinado teto considerado pelo programa computacional da RF. O valor por mim declarado de meu plano de saúde é porque possuo (será “insanidade”?) dois planos de uma mesma instituição privada – conforme já mencionado – e, lógico, com o mesmo CNPJ. Agora, caro leitor, antes de explicar tal “insanidade”, permita-me fazer algumas digressões sobre a Internet, para amenizar a leitura deste texto, e para ver como estamos escravos dessa Tecnologia que surgiu em 1981, como Bitnet.

                   A Internet hoje substitui o aforisma cartesiano: Se penso, logo existo, pelo aforisma de qualquer site de busca: Se estou na Internet, logo existo. Contudo, no caso do IR, há uma variante apreensiva: Se estou no Banco de Dados da RF, sou um possível fraudador (culposo ou doloso). Aliás, sobre a busca na Internet, que é muito usada por estudantes e pesquisadores, via Ctrl C e o Ctrl V, creio ser oportuno chamar a atenção de quem desconheça e que levem em consideração a definição de Internet do físico norte-americano Tony Rothman: A Internet tem a dimensão de uma galáxia, mas a profundidade de um dedo.    

                   Ainda falando na Internet (aliada ao seu instrumento fundamental: o computador), embora seja hoje uma ferramenta poderosa (com a ressalva da definição acima), ela acabou com o romantismo dos anos dourados, que terminaram com o advento dela, Internet. Por exemplo, hoje quase ninguém mais escreve cartas, manda e-mails; o leitor ou escritor (direta ou indiretamente) não usa mais o Manual de Informações da RF (MIRF) e sim, o computador. Com isso, o declarante só sabe o resultado de seu imposto (a receber ou a pagar), no final da declaração quando clica no item Resumo da Declaração. Certamente, deve haver uma maneira de acompanhar esse cálculo no site da RF; eu nunca fiz esse acompanhamento. Voltemos aos anos dourados. Nessa época o IR era feito no formulário que acompanhava o MIRF, e o contribuinte (ou alguém que fizesse para ele) sabia cada passo que dava na medida em que o ia preenchendo. Em tempo: eu não sou contra o uso do computador (tanto que estou digitando este texto em uma dessas máquina) e nem contra a Internet, porém, uso-os “com moderação” (advertência desta expressão hoje em moda para os consumidores de cerveja), tendo em vista a definição do Rothman e a minha ignorância em “navegar” na Internet.   

                   Nessa altura, creio que o leitor já quer saber a razão de eu possuir dois planos de saúde de uma mesma empresa privada, que chamarei de ESP. Vamos lá. Na década de 1980, certamente por influência do Primeiro Mundo, começou a ser oferecida aos brasileiros a proposta do SEGURO SAÚDE PRIVADO (SSPr). Você aderia a essa proposta, e colocava mulher e filhos (e, eventualmente, outros parentes) como dependentes. Eu, por exemplo, aderi a um desses Seguros, incluindo minha mulher e dois filhos como dependentes. Essa minha proposta (e creio também que a de milhares de brasileiros), no entanto, era só hospitalar. Se o titular ou o dependente fosse hospitalizado, tinha direito à hospitalização, com a condição de que pagasse uma caução, que lhe era restituída, quando a instituição seguradora dava o “sinal verde” para o Hospital. Porém, todos os serviços médicos são pagos pelo titular e depois reembolsado da despesa. Creio ser oportuno dizer que, como esse meu SSPr começou a aumentar cada vez mais, e meu salário não, fui retirando os meus dependentes: hoje, estou sozinho com ele, e pagando um valor substancial.  

                   Neste momento, acho que o leitor tem duas dúvidas: 1) Por que tenho um outro SSPr?; 2) Por que continuo com o meu primeiro seguro? Vamos por partes. O segundo SSPr eu fiz por intermédio da Sociedade Brasileira de Física, e na mesma empresa do meu primeiro SSPr (daí o mesmo CNPJ nas minhas duas DR que estão no BDRF, segundo falei acima), plano esse que me dá direito a exames laboratoriais, clínicas de diagnósticos, consultas médicas e hospitalização, desde que eles estejam na rede de convênios com a ESP. Agora, vamos à resposta da segunda dúvida do leitor. Não me desfiz do primeiro SSPr por já haver investido muito dinheiro nele (há quase 30 anos e, graças a Deus, eu, pessoalmente, ainda não precisei dele nenhuma vez) e, também, por esperar que, em algum dia, antes de eu morrer, possa transformar o primeiro SSPr em um plano que me ofereça as vantagens do segundo, e os mesmos direitos do primeiro. No momento atual, não pode haver essa transformação, segundo me informaram na ESP, pois o primeiro é um SEGURO SAÚDE INDIVIDUAL e o outro, um PLANO DE SAÚDE EMPRESARIAL. 

                   Antes de fazer um pequeno comentário sobre Plano Habitacional Privado (PHP), explico a razão de eu sempre pagar, de modo correto, o IR. Como tenho duas aposentadorias (municipal e federal) e já sou idoso, as duas Cédulas C (CC) que recebo, informam o rendimento não-tributável devido ao benefício de eu ter mais de 65 anos de idade. Porém, quando faço a Declaração, tenho que considerar apenas um dos benefícios. Portanto, tenho que pagar imposto sobre o outro, uma vez que esse benefício foi considerado em cada CC. Aliás, isso já me acontecia antes de completar 65 anos, por uma outra razão: o abatimento do limite de rendimento não-tributável, considerado em cada CC e que, na declaração final, só deve ser considerado uma vez.

                   Agora, o comentário sobre PHP. Eu não tenho nenhum, porém, creio ser interessante contar ao leitor o drama que eu e minha mulher Célia vivemos desde muitos anos. Depois de mais de 30 anos de fazermos economia (casamos em 1962), em 1994, adquirimos um apartamento que estava anunciado em um jornal de Belém. Compramos, pois a Corretora de Imóveis garantiu que o imóvel estava todo legalizado, segundo lhe informara o dono do mesmo. Quando tentei passar a escritura para nosso nome, uma surpresa: havia duas penhoras, devido a dívidas do dono do apartamento para dois Bancos e que, hoje, não existem mais. Em vista disso, fomos a um determinado escritório de advocacia para os processos legais cabíveis. Muito embora, já tenhamos a Escritura do apartamento, inclusive com Registro de Imóveis, desde fevereiro de 2000, a situação judicial permanece indefinida, pois a massa falida dos dois ex-Bancos, agora sob a tutela governamental, não deu solução para essa questão. Aliás, no Brasil e, agora no mundo capitalista, de acordo com essa mega crise mundial, que surgiu exatamente nos Estados Unidos por causa de PHP, conforme o mega investidor George Soros registra em seu recente livro [O Novo Paradigma para os Mercados Financeiros: A Crise Atual e o que Ela Significa (Agir, 2008)], decorre do aforisma: Privatização dos Lucros e Socialização dos Prejuízos. Essa socialização será paga pelos cidadãos do mundo inteiro que vivem de empregos: ou porque os perderam, ou porque seus salários foram congelados ou quiçá reduzidos.

                   Concluindo este artigo, acredito que ainda há uma dúvida a esclarecer ao leitor que, por exemplo, só depende do Estado para realizar os três grandes problemas de sua vida: aposentadoria, saúde e habitação. Aposentadoria Estatal agora tem um limite de valor (embora você a pague correspondentemente ao seu salário integral) e, mais, você continua pagando até morrer; a Saúde Estatal está um caos, conforme se vê todo o dia na mídia: escrita, falada e televisada; e a falência da Habitação Estatal, que promoveu uma coisa nova no Brasil: o MOVIMENTO DOS SEM TETO. Aliás, é oportuno dizer ao leitor que essa situação brasileira não é ideológica, pois ela vem se agravando desde a descoberta do Brasil, em 22 de abril de 1500. Nos Estados Unidos, por exemplo, com menos intensidade do que no Brasil e no Terceiro Mundo, também existem os: homeless (“sem lar”).   

                   Ao concluir a leitura deste artigo, certamente o leitor tem em mente a pergunta: Por que esse NOVO CONTO (DE HORROR?) DO PACO? . Eu arrisco uma resposta, dada por Sigmund Freud no começo do Século 20: O Homem não é um Ser Social, e muito bem sintetizada pelo meu analista e grande amigo, Dr. José Paulo de Oliveira Filho: Todos nós temos um lado canalha!

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