NA EXTINÇÃO DO DMER

ENGENHARIA: CIVIL E RODOVIÁRIA

NA EXTINÇÃO DO DMER

Por causa da Reforma Administrativa que o Prefeito Sahid Xerfan está implantando na Prefeitura Municipal de Belém (PMB), 1990 iniciou-se com a extinção do Departamento Municipal de Estradas de Rodagem (DMER), seguramente um dos órgãos municipais mais competentes no ramo da Engenharia Rodoviária no Norte do Brasil. Acho que vale a pena relatar um pouco da história desse órgão, no qual trabalhei por mais de trinta (30) anos, de 1954 até 1985. No relato, usarei os registros da memória e as notas de meu amigo e companheiro Lauro Veloso Menezes, o último Diretor da Divisão de Administração e Finanças do DMER, a quem agradeço nesta oportunidade.

A fim de dar cumprimento à Lei Federal no. 302, de 13 de julho de 1948, que instituiu o Fundo Rodoviário Nacional (FRN) (decorrente do Decreto no. 8.463 do Presidente José Linhares, em 1945), o então Prefeito de Belém, Rodolfo Chermont, assinou no dia 25 de maio de 1949 o Decreto no. 533, criando o Serviço Municipal de Estradas de Rodagem (SMER), sendo escolhido para seu primeiro Diretor o engenheiro civil Alírio César de Oliveira. Esse órgão instalou-se em uma sala cedida pelo Departamento de Engenharia da PMB, que funcionava num prédio localizado na Praça D. Pedro II (hoje, nesse local, situa-se a Assembléia Legislativa do Estado), em cujo térreo funcionava, também, a Câmara Municipal de Belém.

O SMER teve vários diretores, à medida que os Prefeitos de Belém iam se sucedendo. Assim é que o Dr. Richard Sckmandeck, engenheiro de origem austríaca, dirigiu o órgão na gestão do médico Lopo Alvarez de Castro, iniciada em 1950. O Dr. Alírio voltou à direção do SMER com a vitória de Celso Cunha da Gama Malcher, otorrinolaringologista, por ocasião das eleições municipais de 1953. Nessa gestão do Dr. Alírio é que foi implantado no SMER um Laboratório de Solos, instalação realizada pelos engenheiros Carlos Cunha e Isaac Barcessat. Com a ida do Dr. Alírio para a direção do Departamento de Estradas de Rodagem do Pará (DER/PA), o SMER foi dirigido pelos engenheiros civis Luiz Gonzaga Baganha, Heronides Gomes de Moura e Ocyr de Jesus de Moraes Proença, até o fim do mandato do Dr. Celso Malcher. A volta do Dr. Lopo de Castro à Prefeitura de Belém, em 1958, fez com que o SMER fosse dirigido pelo engenheiro civil Evandro Simões Bonna, em cuja gestão o SMER transformou-se no DMER, graças à Reforma Administrativa planejada pelo engenheiro civil Fernando Leão Guilhon, do Quadro de Funcionários do DER/PA. Essa reestruturação foi aprovada pelo Decreto no. 4385, de 27 de novembro de 1959, sancionado pelo Prefeito Municipal, em exercício, Dra. Alice Antunes. É oportuno destacar que, na transformação referida acima, houve a criação do Conselho Rodoviário Municipal (CRM), cujo Presidente era o engenheiro civil Augusto Meira Filho, com os seguintes Conselheiros: o Diretor do DMER, Dr. Bonna, os engenheiros civis José Maria de Azevedo Barbosa, representante do Clube de Engenharia do Pará (CEP), e Cândido Araújo, Diretor da Secretaria Municipal de Obras, Washington Costa, Diretor do Serviço de Divulgação, Turismo e Costumes da Prefeitura de Belém, e o odontólogo Fernando Gurjão Sampaio, representante da Associação de Granjeiros de Belém.

Ao assumir a PMB, em 1961, o Coronel Luís Geolás de Moura Carvalho convidou o engenheiro civil José Maria Cordeiro de Azevedo, do DER/PA, para dirigir o DMER. Foi durante a sua gestão que o DMER começou a construir a sua sede própria, na Avenida Almirante Barroso, em terreno doado pelo Governador do Estado, o advogado Aurélio Correa do Carmo, junto a sua Oficina Mecânica, conhecida como “britador”. O projeto do prédio foi de autoria do engenheiro civil Camilo Sá e Souza Porto de Oliveira, do DER/PA, sendo o cálculo estrutural realizado pela Secção de Estudos e Projetos do DMER, sob a minha responsabilidade (assim como o início de sua construção), e a construção final a cargo dos engenheiros civis Ocyr Proença e Jofre Alves Lessa, do quadro do DMER. Ainda na gestão do Dr. Azevedo foi criado o Grêmio Rodoviário Municipal (GRM), sendo o Rubim seu primeiro presidente.

Em decorrência do Movimento Militar de 1964, o Coronel Alacid da Silva Nunes foi designado Prefeito de Belém, ocasião em que o Dr. Alírio voltou a dirigir o DMER pela terceira vez, ficando, inclusive, na administração do Prefeito Oswaldo Mello. Nessa terceira gestão à frente do DMER, o Dr. Alírio concluiu o Edifício-Sede, criou o Serviço Médico-Ondotológico, como ainda criou o Distrito Rodoviário de Mosqueiro, chefiado pelo engenheiro civil José da Silva Machado, nosso colega no DMER. Aliás, esse engenheiro merece um destaque especial por ser o único que trabalhou, com competência, mais de trinta (30) anos sem nunca tirar férias e faltar um dia de trabalho (nos empregos públicos pelos quais passou), e por haver, especialmente, “vestido a camisa” do DMER. Em vista dessa dedicação ao trabalho, não seria exagero dizer que o rodoviarismo municipal deve muito ao Machado. Com a eleição do advogado Stélio Maroja Prefeito de Belém, em 1966, assumiu a direção do DMER o engenheiro civil Maluf Gabbay, do DER/PA.

Após a gestão de Stélio Maroja, os Prefeitos das capitais brasileiras passaram a ser escolhidos por via indireta, já a partir de 1970. Na Gestão do Capitão Mauro Porto, o DMER foi dirigido pelo engenheiro civil Mariuadir José Miranda Santos, do DER/PA, logo depois substituído pelo engenheiro civil José Augusto Soares Affonso, do DMER. (Eu cheguei a ser Diretor do DMER, por alguns dias, na transição entre os dois.) O engenheiro civil Deusimar Macedo, do DER/PA, foi chamado pelo Prefeito Coronel Nélio Dacier Lobato para dirigir o DMER, enquanto outro engenheiro civil do DER/PA, Ramiro Nobre e Silva, dirigiu os destinos do órgão na administração do médico Otávio Bandeira Cascaes. Quando o advogado Ájax Carvalho d´Oliveira assumiu a PMB, em 1976, o DMER voltou a ser dirigido por um engenheiro civil de seu próprio quadro, Sílvio Samuel Moreira Aflalo.

Em continuação aos diversos Prefeitos nomeados, tivemos a volta de Ramiro à direção do DMER quando era Prefeito o Coronel Felipe Santana. Ramiro continuou à frente desse órgão durante uma boa parte da Gestão do engenheiro civil Loriwal Rei de Magalhães (ex-funcionário do DMER), na PMB. O Affonso voltou à direção do Departamento (por minha indicação) no final do mandato do Prefeito Loriwal, e permaneceu lá por todo o mandato do Prefeito, o cárdio-cirurgião Almir José de Oliveira Gabriel. Por fim, com a volta das eleições municipais, foi eleito Prefeito, em 1985, o economista Fernando Coutinho Jorge, que convidou para dirigir o DMER o engenheiro civil Luís Roberto Horácio Freire, o qual, por muitos anos, dirigira a Divisão de Máquinas e Equipamentos. O Dr. Freire continuou na direção do Departamento até a sua extinção, no dia 31 de dezembro de 1989, já na Gestão do Prefeito Sahid Xerfan.

Entende-se que durante os quarenta e um (41) anos da existência do SMER/DMER, executaram-se muitos serviços de drenagem e obras de arte, de terraplenagem e pavimentação em muitas estradas do Plano Rodoviário Municipal, que inclui o Município de Belém, e os distritos de Icoaracy-Outeiro e Mosqueiro. Mas aqui me apraz destacar apenas aquelas obras que asseguraram a esse órgão municipal um lugar de destaque na Engenharia Rodoviária do Norte do Brasil. Por exemplo, o projeto (elaborado por mim e pelo Loriwal) e início da construção da Nova Belém-Icoaracy, ligando a Rua Tavares Bastos ao Tapanã, realizada na segunda Gestão do Dr. Alírio, estrada não concluída em virtude da segurança de vôo do Aeroporto de Belém. Projeto completo, incluindo drenagem (sob a minha coordenação), das terceira e quarta pistas de concreto da Avenida Almirante Barroso, trecho São Braz-Avenida Dr. Freitas, cuja construção foi realizada pela Empresa de Construções Civis e Rodoviárias (ECCIR), dos engenheiros Manoel Ibiapina Macedo e Hermógenes Conduru, na Gestão do Dr. Maluf Gabbay. Outra obra de vulto realizada na Gestão do Dr. Sílvio Aflalo foi a construção da Rodovia Augusto Montenegro, também efetuada pela ECCIR. Nesta oportunidade, destacou-se o acompanhamento de alto teor técnico e profissional feito pelo Laboratório de Solos do DMER, nas pessoas dos engenheiros civis Antônio Cantão do Amorim Filho e Paulo Sérgio Fontes Nascimento, e do técnico em solos Carlos Silva. Entre outras notáveis realizações do DMER, vale citar o projeto (também sob minha coordenação) e construção da Rodovia Pedro Álvares Cabral e Avenida Perimetral, ao longo das gestões dos Drs. Mariuadir, Affonso, Deusimar e Ramiro. Destaque-se que, por ocasião da construção da Avenida Perimetral, em um dos trechos (Universidade Federal do Pará e Avenida Alcindo Cacela) que constitui a Avenida Bernardo Sayão (a antiga Estrada Nova), destacou-se a solução utilizada (brita graduada), sugestão do engenheiro rodoviário Washington da Silveira Britto, até hoje em perfeitas condições. Coube à Estacon Engenharia S. A., dos engenheiros civis Lutfala Bitar e Ronald Costa Borrajo, a construção do restante do trecho daquela Avenida, até o Arsenal de Marinha.

Por fim, é de justiça salientar que as obras realizadas pelo DMER sempre estiveram a cargo de um corpo técnico altamente qualificado, visto os seus engenheiros, a maioria deles com cursos de pós-graduação, lato e stricto sensu, serem profissionais liberais de grande prestígio na comunidade paraense e amazônica, alguns deles Professores Universitários e/ou donos de Empresas de Engenharia. O mesmo se pode dizer de seu corpo administrativo, jurídico e médico-odontológico. E é só, como se diz em estilo de Ata, o que aqui se lavrou para constar.

MINHA VIDA COMO ENGENHEIRO RODOVIÁRIO E CIVIL

Neste artigo, vou contar um pouco de minha vida como engenheiro rodoviário do DMER e, também, como profissional liberal de engenharia civil/estrutural.

A.ENGENHARIA RODOVIÁRIA

Como aluno-calouro do Curso de Engenharia Civil, entrei no então SMER em março de 1954 por indicação de Loriwal Rei de Magalhães, que é meu amigo de adolescência e com quem trabalhava em serviços de Agrimensura, juntamente com seu cunhado Heronides Gomes de Moura e com o saudoso Pedro Furtado (Loriwal, além de aluno de engenharia civil, era agrimensor, como o Pedro, e o Moura era também aluno de engenharia civil). Eles eram donos da firma denominada Arquitetura, Engenharia e Agrimensura (ARQUENAGRI), localizada no Edifício Vítor Tamer, na Rua Senador Manoel Barata, entre as Travessas Campos Sales e Frutuoso Guimarães. Lá, comecei a aprender como se faziam levantamentos topográficos, planimétricos e altimétricos, usando, respectivamente, o teodolito e o nível, e como representá-los em desenhos (plantas ou pranchas). Vejamos como era obtida tal representação. De posse dos dados topográficos recolhidos no local de trabalho (terreno, rua, estrada etc.), eles eram transformados em desenhos-rascunhos, o planimétrico em papel branco opaco, e o altimétrico em papel milimetrado opaco, colocados em uma prancheta de madeira, coberta com o mesmo papel branco opaco. Para realizar essas plantas, usávamos lápis FABER (números 1 e 2), um par de esquadros de plástico [isósceles (45o) e escaleno (30o e 60o)], que deslizavam em uma Régua T. Esta possuía uma régua central inteiramente de plástico, ou de madeira e com as bordas de plástico, e servia para traçar retas horizontais. Em alguns casos, ela dispunha de um dispositivo que poderia incliná-la. Além disso, usávamos também escalas triangulares, compassos, para traçar círculos, transferidores para marcar ângulos, e, obviamente, borrachas para apagar os erros involuntariamente cometidos. Os compassos tinham uma ponta seca (um estilete fino) e uma outra na qual era adaptado: ou a grafite ou o tira-linhas (duas peças articuladas entre as quais era colocada a tinta nanquim).

Depois de concluídos esses rascunhos, eles eram cobertos com papel vegetal e seus riscos traçados com tinta nanquim, por intermédio de tira-linhas, dotados de cabo, para traçar retas. Para traçar círculos, os compassos com tira-linhas, referidos acima, eram utilizados. Para pequenos círculos, usávamos o compasso conhecido como “bailarina”. Os dados alfa-numéricos de cada planta eram escritos com o normógrafo, um conjunto de réguas vazadas, com letras e números de várias formas e tamanhos, e que eram reproduzidas por meio de uma caneta, contendo um pequeno depósito e um estilete, para controlar a espessura da tinta nanquim nele colocada. Lembro que a manipulação desses instrumentos de desenho me foi ensinada pelo Moura, que era um exímio desenhista. Como complemento final de cada planta, era indicada a direção do norte magnético (obtido com o teodolito). Por fim, no canto inferior direito de cada prancha havia um selo no qual eram colocadas todas as informações que a identificavam. Assim, o nome da ARQUENAGRI aparecia logo na parte de cima do selo. Depois, seguia-se a descrição dos serviços correspondentes, o nome do contratante, os nomes dos autores do desenho e dos dados topográficos, as escalas utilizadas e a data. De cada planta, cujo original em vegetal era arquivado, eram feitas cópias heliográficas, cujo número dependia do solicitado pelo contratante. Lembro-me de que, no final de cada dia de serviço na ARQUENAGRI, eu lavava o material utilizado no Bar Santiago, situado na esquina da Travessa Frutuoso Guimarães, no lado oposto ao do prédio onde ficávamos. Para retirar os resíduos de tinta nanquim, ou mesmo de ferrugem, que ainda ficavam nas extremidades dos tira-linhas depois da lavagem, eu usava lixa, seguindo a orientação do Moura. Creio ser oportuno registrar que os instrumentos ópticos (teodolito e nível) e o estojo contendo os tira-linhas eram da marca KERN, adquiridos na Livraria do Laurindo Garcia, situada na Rua Oliveira Belo, no mesmo quarteirão do Hospital da Santa Casa. Também lá eram adquiridos os demais apetrechos (descritos acima) usados na realização dos serviços topográficos. Registro que a ARQUENAGRI fechou em 30 de abril de 1955, conforme me informou o Moura.

Na ocasião em que comecei a trabalhar no SMER, dirigido pelo Alírio César de Oliveira, ele funcionava em uma sala do então Departamento de Engenharia da Prefeitura de Belém, localizada na Avenida Nazaré esquina com a Travessa Quintino Bocaiúva, onde hoje está instalada a Companhia de Desenvolvimento Municipal (CODEM). Lembro-me de ficar na mesma sala dos desenhistas Osvaldo Pinho e João Pinto (este também artista plástico), funcionários daquele Departamento. Inicialmente, eu era apenas um estagiário sem remuneração, porém, em 19 de abril de 1954 passei a exercer a função de Auxiliar de Topógrafo, como extranumerário diarista e lotado na Secção de Estudos e Projetos. Logo depois, ainda em 1954, esse órgão rodoviário municipal transferiu-se para um bangalô, de propriedade do advogado Waldemar Viana, situado na Avenida Conselheiro Furtado, próximo da Rua Padre Eutíquio (hoje, número 631 e onde se localiza uma Agência do BRADESCO). Em 1955, fomos transferidos para a casa onde morou o médico Deusdeth Moura Ribeiro, na Avenida Padre Eutíquio (hoje, número 1393 e onde se localiza a Farmácia de Manipulação ARTESANAL). Por fim, entre final de 1961 e começo de 1962, o SMER instalou-se na Avenida Almirante Barroso (antiga Avenida Tito Franco), próximo da Estrada do Utinga e defronte do Instituto Lauro Sodré, em instalações provisórias da Oficina Mecânica. Neste adendo, vou registrar os nomes de alguns de meus colegas (infelizmente não citarei os nomes de todos e nem os nomes completos dos aqui lembrados, pois, com a extinção desse Órgão Municipal, em 31 de dezembro de 1989, seu arquivo ficou de difícil disponibilidade e, portanto, usarei a minha memória e a de alguns colegas citados nessas lembranças, dentre eles destaco os engenheiros Affonso, Amorim, Baganha, Bonna, Dourado, Igreja, Loriwal, Machado, Moura, Paulo Sérgio e Sílvio, o ferreiro Ismaelino e a biblioteconomista Haydée Coelho de Oliveira, aos quais muito agradeço), e algumas situações (hilárias, inusitadas e tragicômicas) que vivenciei nesses três lugares.

SEDE DO SMER NA AVENIDA CONSELHEIRO FURTADO

Nessa sede, a parte técnica era desenvolvida pelos engenheiros Alírio (diretor, secretariado por Arlete Murta e Onélia), Baganha e Celestino Rocha, pelos acadêmicos de engenharia (eu, Loriwal, Moura, Sílvio Aflalo e Jofre Alves Lessa), e pelo desenhista Benedito Mello. A parte administrativa estava sob a responsabilidade de Lauro Menezes, auxiliado por Antônio, Fernando de Souza Paula (“Catita”), Idineu Viegas Pantoja (“Didi”), Orlando Rocha (“Caboco”), Raimundo Pinheiro Freitas (pagador), Rubilar Campelo da Costa e Rui. O Rui Urdininéia Conduru era o consultor jurídico e o almoxarife era o Epitácio Cabral Pereira (“Tio Pita”). Dentre os funcionários do SMER, que trabalhavam fora dessa sede e dos quais me lembro, registro os seguintes: os capatazes, os irmãos Rodrigues: Francisco (“Chico”) e José (“Neném”), o Norberto Martin Rodrigues e o Pompeu. Os motoristas Osvaldo Cruz (“Lascada”) e Walter Gomes de Mello (“Farofa”), o ferreiro Ismaelino Nunes Melo, os operadores de máquina: Galdino, operador do rolo compressor e os operadores de motoniveladora “Cuca”, Dalcídio Gomes Carvalheiro (“Tucano”) e os irmãos Cruz: José (“Zé Risada”) e Maurício (“Bananeiro”), além do carpinteiro Hermenegildo Bentes e do pedreiro José Pereira. No Mosqueiro, o Peralta funcionava como um Administrador do SMER. Recordo ainda que na frente da Oficina Mecânica existia um “britador”, operado por José Arimatéia (“Bode do morro”), que era uma máquina que triturava pedaços de brita (pertencente à Prefeitura), que eram utilizados na construção da Segunda Pista de Concreto daquela Avenida, conduzida pelo SMER. Anoto ainda que, no início de minha vida no SMER, acompanhava o Loriwal nos serviços topográficos necessários para a concretagem da Segunda Pista que estava sendo realizada na altura do 26o BC. Creio ser oportuno registrar que a existência desse “britador” deu ensejo a que trabalhadores e técnicos do SMER fundassem um time de futebol denominado Britador Futebol Clube, conforme me lembrou o ferreiro Ismaelino.

Objetivando saber da situação da Rede Rodoviária sob a responsabilidade do SMER, o Dr. Alírio determinou o seu levantamento topográfico pois, como o leito das estradas que compunham essa Rede era de piçarra, ele pretendia pavimentá-las. Creio ser necessário dizer que, em virtude do FRN, os órgãos rodoviários (municipal, estadual e federal) possuíam um orçamento determinado que lhes permitia realizar obras. É claro que esse orçamento era completado com verbas das Prefeituras de cada Município, dos Governos de cada Estado e do próprio Governo Federal. Assim, ainda no primeiro semestre de 1954, Loriwal, Heronides Moura e Sílvio, tendo eu como auxiliar, trabalhamos no levantamento topográfico das três principais estradas daquela Rede: 1) a Estrada Arthur Bernardes (mais tarde denominada ), que se iniciava na Travessa Coronel Luís Bentes e dava acesso ao Aeroporto de Val de Cãns e à Vila de Pinheiro (hoje, distrito de Icoaracy), margeando a orla marítima de Belém; 2) a Estrada da Tavares Bastos ( ), que ligava a Tito Franco, a partir do Bar do Souza, até as cabeceiras das pistas do Aeroporto de Val de Cães; 3) a Estrada Coqueiro-Tapanã ( ), que ligava a então Estrada Belém-Bragança com a Arthur Bernardes, na altura da Hospedaria do Tapanã, e que cruzava com o Ramal de Pinheiro da Estrada de Ferro de Bragança. À medida que os dados topográficos eram obtidos no campo, eles eram transformados em desenhos, por intermédio do Benedito Mello e com o meu auxílio, tendo em vista o aprendizado que ia tendo, concomitantemente, na ARQUENAGRI, seguindo o ritual que descrevi anteriormente.

Em julho de 1954, Loriwal e eu, com a participação do topógrafo José Alberto (“Zé Alberto”) Murta (funcionário da Secretaria Municipal de Obras), fomos fazer o levantamento topográfico da Rede Rodoviária da Ilha do Mosqueiro, que era (e ainda é) uma Vila Balneária. Fizemos o levantamento das estradas que acompanhavam as praias dessa Vila, desde o trapiche, que recebia os navios da então SNAPP e que levava os veranistas até a Praia de Carananduba, passando pelas Praias Grande, Farol, Chapéu Virado, Porto Artur, Murubira, Ariramba e São Francisco. Levantamos, também, a estrada central (hoje, rua 16 de novembro), que ligava a Vila até Chapéu Virado.

Durante esse serviço topográfico, lembro-me de duas situações tragicômicas. Logo que chegamos a Mosqueiro, nos hospedamos no Hotel do Farol, de propriedade do advogado Zacharias Mártyres (tio-avô de minha futura mulher Célia). Depois de um dia estafante de trabalho, Loriwal, José Alberto e eu nos preparamos para jantar. Naquela época, a luz elétrica na Ilha era deficiente e a iluminação era complementada com candeeiro, do tipo “Petromax”. Na sala de jantar desse Hotel (cheia de socialites paraenses), existiam alguns candeeiros, um deles, justamente atrás da cadeira em que me preparava para sentar. Quando o fiz, o espaldar da cadeira partiu e derrubei o candeeiro. O Dr. Zacarias, que sempre prestigiava esse jantar, levantou-se, dirigiu-se para mim e sentenciou: Seu filho da …., você não sabe se comportar como gente de bem. Veja o que você fez. Eu, envergonhado pela cena, não sabia o que fazer. Loriwal socorreu-me dizendo: Chenca, não dê atenção, ele é assim mesmo. Devo registrar que, como ficamos hospedados nesse hotel por muito tempo, o Dr. Zacarias tornou-se um grande amigo nosso, pois conversava conosco sempre depois do jantar, em uma varanda do Hotel que dava para a Ilha dos Amores. Devo também registrar que o nome “Chenca” pelo qual o Loriwal me chamava (e ainda me chama), derivou do seguinte. Quando adolescentes, Loriwal e eu saíamos de noite para curtir. Quando voltávamos, depois de meia-noite, meu pai sempre estava na esquina da Rua Arcipreste Manoel Teodoro com a Avenida Padre Eutíquio me esperando, pois só dormia depois de eu chegar. E, sistematicamente, dizia: Passa para casa Chenca. Como era espanhol, ele queria dizer “Zeca”, que era meu apelido caseiro.

O segundo episódio, lembrado pelo Loriwal, ocorreu quando, na ausência do Zé Alberto, que tinha vindo a Belém, usei as botas dele para fazer o serviço de campo. Quando voltamos ao Hotel, eu havia desmantelado o solado de uma das botas. Ela ficou como uma “boca de jacaré escancarada”. Tentando consertá-la, amarrei-a com um pedaço de arame. Claro que ela só foi consertada quando o Zé Alberto voltou e levou para um sapateiro fazer o serviço certo, depois de me dar um verdadeiro esculacho. Anoto que, no final desses serviços topográficos, Loriwal e eu (o Zé Alberto já havia voltado para Belém) ficamos hospedados na casa do Peralta, em Carananduba.

É oportuno registrar que o levantamento topográfico que fizemos na Ilha do Mosqueiro foi até o Igarapé Sucurijuquara. Somente no começo da década de 1960, eu e o Affonso trabalhamos no projeto da estrada que ligou esse igarapé à Baia do Sol. Lembro-me de que, ao concluir a travessia desse igarapé com o teodolito no ombro, um peão perguntou para mim se eu não havia visto uma sucuriju junto de mim. Comecei logo a tremer de medo; sem razão, pois o perigo já havia passado. Em tempo: Sucurijuquara significa em tupi, “lugar de muita sucuriju”.

Creio ser oportuno dizer que a ligação entre o município de Benevides e a Ilha do Mosqueiro, por intermédio de uma ponte de concreto armado, no local denominado Furo das Marinhas, foi idealizada pelo Construtor Licenciado Sebastião Rabelo de Oliveira, em 1946. Muito embora o engenheiro e empreiteiro Rui Luiz de Almeida haja, por volta de 1958, feito uma proposta ao Governo do Pará e à Prefeitura de Belém para construir essa ponte, cobrando pedágio por 30 anos, a sua construção só foi iniciada no final do primeiro Governo do Coronel Alacid Nunes, continuou no Governo do engenheiro civil Fernando Guilhon, foi concluída, em 1975, no Governo do professor Aloysio Chaves e recebeu, merecidamente, o nome de seu idealizador.

Na Sede da Conselheiro, recordo-me das famosas reuniões que aconteciam na sala onde ficava o Epitácio. Às onze horas da manhã nos reuníamos nesse local para participar do sorteio de uma garrafa de uísque (adquirida pelos participantes do sorteio e geralmente comprada de contrabando, que grassava em Belém dessa época) e de uma farofada que ele preparava. Os números escolhidos por cada um de nós eram registrados na roda vazia de um dispositivo de durex. Depois de acionada, ela era amortecida por um palito de fósforo, e a torcida começava para saber em qual número ela pararia. Era uma roleta estilizada. A farofada era feita da seguinte maneira. Comprávamos chouriço, lingüiça, cebola, alho e farinha d´água. O Epitácio colocava os dois primeiros ingredientes em uma panela com álcool e tocava fogo. Quando estavam no ponto, isto é, bem escuros, ele cortava a cebola e o alho e fazia a mistura com a farinha. Naquela época não existia a neurose dos colesteróis (bom e ruim) e nem dos triglicérides.

SEDE DO SMER/DMER NA AVENIDA PADRE EUTÍQUIO

No ano seguinte, em 1955, o SMER mudou-se para a casa onde morou o médico Deusdeth Moura Ribeiro, na Avenida Padre Eutíquio (hoje, número 1393 e onde se localiza a Farmácia de Manipulação ARTESANAL). Nessa casa, outros colegas foram se incorporando ao Corpo Técnico Administrativo do SMER, dos quais me lembro dos então acadêmicos de engenharia Antonino Cantão de Amorim Filho, Antonio José da Silva Magno, Carlos Miguel Santos Cavalcante, Claudionor dos Santos Siqueira, Frederico Guilherme Chaves, José da Silva Machado, José Luiz Ortiz Vergolino, Lindolfo José de Campos Soares, Moisés Benchimol e Rodolpho Pereira Dourado. Além deles, os engenheiros Isaac Barcessat, Carlos Cunha, Ocyr Proença e Evandro Bonna, e as funcionárias Maria das Neves Moura Lopes (secretaria), Maria Grassy de Andrade, Dalva, Cléa dos Reis Gomes, os auxiliares de almoxarife Eduardo Ferreira de Oliveira, Luiz Gonzaga de Magalhães Ramos (“Língua de Trapo”) e Olavo Rocha, além do agrimensor José Maria Reis e Souza (depois, engenheiro) e os serventes Guaraciaba Barros Ferreira e Mâncio Coelho Pinheiro, e os motoristas Gabriel, Alcindo (conhecido como “Talo de Jaca”, pois possuía um defeito no braço esquerdo, em virtude de o haver quebrado e mal consertado. Ele dirigia um “jeep” apelidado de “Tomara que Chova”, que era usado para fazer o pagamento semanal dos trabalhadores do SMER), “Mineirão”, “Bebeto”, José Severiano da Silva (“Paraíba”) e Raimundo Marques da Silva (“Pilucu”). Também trabalharam conosco nessa casa João Batista Klautau de Araújo (Consultor Jurídico), Dimas Teles, que foi técnico do Clube do Remo, Cândido de Vasconcelos de França Messias (estes disputavam quem se vestia melhor), assim como o Expedito Rubim Campos, que começou a organizar o Setor de Pessoal. Como funcionários fora da sede, lembro-me do Enéas, José de Oliveira Carvalho, o mestre Ivo Rodrigues, os mecânicos Dagoberto Titan (“Perna Santa”), Emídio Benevenuto da Costa (“Cabra”), Francisco Dionísio de Lima (“Chico Fera”), e Wladir Barral (“Apertadinho”), o pintor Guilherme dos Anjos (“Palito”), que havia sido excelente “center forward” (hoje a camisa 9) do Remo e da Tuna. Além desses colegas, também trabalhavam fora da sede, em serviços diversos, Alberto Oliveira da Costa (“Boi”), Antenor Freitas (“Araçari”), Antonio Bernardino de Oliveira (“Jibóia”), Raimundo Teixeira da Costa (“Curica”) e Romano, operadores de patrol, João Fabiano Balera (“Cachorro”), João Lima Lobato (“Sapo”), Manoel Fernandes Sobrinho (“Paciência”) e Nilton Roberto Câmara (“Totoca”). Registro que, no dia 3 de agosto de 1955, fui nomeado pelo Prefeito Celso Malcher para exercer interinamente o cargo de Desenhista, lotado na Secção de Estudos e Projetos, sendo o Moura o Diretor Geral do SMER.

Do trabalho nessa casa, anoto três fatos inusitados. Conforme registrei no artigo anterior, o Barcessat e o Cunha montaram o Laboratório de Solos do ainda SMER. Pois bem, o Barcessat morava junto dessa casa. Um certo dia ele anunciou, satisfeito, para sua mãe, Dona Ana (“Lina”) Athias, que, no dia seguinte, iria começar a trabalhar na casa ao lado. Ela, espantada, disse-lhe: Meu filho, não faça isso. Aí ninguém trabalha. Imagine que um deles vem sempre apanhar um de seus sapatos que cai em cima do telhado de nossa cozinha, toda a vez que eles jogam bola no quintal da casa. Realmente ela tinha razão. O Dr. Alírio sempre tinha o hábito de chegar tarde na repartição que dirigiu, muito embora ficasse nela até o começo da noite. Ele chegava por volta das onze da manhã. Assim, em alguns dias e quando tínhamos alguma folga em nossos serviços, lá pelas dez horas, suspendíamos nossos afazeres e íamos (cerca de cinco ou seis colegas) para o quintal jogar uma “pelada” com bola de meia ou de papel. O chute que eu dava na bola, às vezes, também a levava junto com um de meus sapatos (normalmente o do pé esquerdo, pois eu gostava de chutar com ele), até o telhado da casa do Barcessat. É claro que essa “pelada” parava antes das onze, para que pudéssemos tomar um banho e voltar para os nossos afazeres.

Nesse primeiro fato, há uma variante. Às vezes aproveitávamos a folga referida acima e íamos para um sítio, na Estrada Belém-Bragança logo depois do Entroncamento. Ele se chamava LAMIROBELO, um acróstico derivado do nome de seus compradores: L de Lauro, A de Alírio, M de Moura, I de Idineu, R de Rubim, O de Orlando, B de Baganha, E de Evandro Bonna, L de Lourival Barbalho (então concluinte de Medicina, amigo nosso, concunhado do Lauro, e a quem ajudei no seu Trabalho de Conclusão de Curso, que envolvia o uso de Estatística) e O de Ocyr. Segundo lembrou-me o Machado, também usuário desse sítio, foi lá inventado o vôlei em piscina. Aliás, em um desses jogos tive minha dentadura quebrada por uma cortada dada pelo Baganha. É oportuno destacar que, segundo me informou o Antonino Amorim, o carpinteiro Anacleto era quem funcionava de cozinheiro das comidas servidas naquele sítio.

O segundo fato, quase trágico, foi o seguinte. Naquela época, o único acesso rodoviário à Vila de Pinheiro era pela referida Estrada Arthur Bernardes, que passava pelas Bases Naval e Aérea de Belém. Havia também um ramal ferroviário, que saía do Entroncamento e ia até essa Vila. Em vista disso, o Dr. Celso determinou que o SMER projetasse um outro acesso rodoviário para Pinheiro. Imediatamente, o Dr. Alírio determinou que a Secção de Estudos e Projetos, chefiada pelo Moura, e tendo o Loriwal como topógrafo e eu como auxiliar de topógrafo e desenhista, estudasse esse novo acesso rodoviário. Inicialmente, partimos do Tapanã e seguimos o eixo da Estrada Coqueiro-Tapanã até a sua segunda curva. Nesta, seguimos sua tangente e continuamos em reta até cruzar a Estrada Tavares Bastos, perto do Igarapé São Joaquim e passando pelo coqueiral de Zeno Ferreira, no qual existia a famosa Piscina Cristal, construída em um braço daquele Igarapé, o Cristal. Assim, no dia em que estávamos no interior dessa propriedade (onde hoje se situa o Residencial Cristal Ville), Loriwal, no teodolito e eu com a balisa de visada, fomos recebidos à bala pelos seus empregados, apesar de o Dr. Alírio haver solicitado permissão prévia ao proprietário para que passássemos por lá. Claro que o tiroteio não foi para matar (felizmente!), e sim, apenas para nos assustar (até hoje, Loriwal e eu não sabemos o porquê daquela agressão). Registre-se que, além de ele ficar com a propriedade valorizada, pois passou a possuir dois terrenos com frente para uma rodovia, ele foi indenizado pela parte dessa nova estrada, recebendo um “jeep” Willys novo.

É oportuno relatar que, por ocasião do levantamento topográfico dessa Nova Estrada Belém-Icoaraci, Loriwal e eu nós divertíamos bastante, pois toda a vez que existia um igarapé o atravessávamos como verdadeiros “Tarzans”, usando cipós.

Ainda por ocasião desse levantamento é que ocorreu o terceiro episódio mencionado acima, no qual participei com uma certa dosagem de esnobismo. Com efeito. Quando nós voltávamos desse serviço, por volta das onze horas da manhã (começávamos às seis horas!), eu ia para a prancheta desenhar os serviços realizados. Contudo, como havia uma especificação técnica sobre os Aeroportos, qual seja, a de que uma pista de pouso deveria ter um determinado cone de segurança, de altura determinada, e dentro do qual não poderia passar nenhuma estrada, era preciso saber se a estrada que estávamos projetando satisfazia essa especificação, tendo em vista que ela passava no prolongamento de uma das pistas de pouso de nosso Aeroporto. Eu conhecia os detalhes geométricos dessa especificação. Porém, para esnobar o Lindolfo Soares, que acabara de ser admitido no SMER, dei-lhe como seu primeiro serviço a locação desse cone, na planta que eu estava desenhando. Obviamente que ele não poderia fazer essa locação, pois ainda não havia cursado a Cadeira de Estradas de Rodagem na EEP, de onde era aluno.

Nesta oportunidade, quero fazer uma pausa para falar de meus estimados amigos Lindolfo e Affonso. Depois da esnobada referida acima, eu e Lindolfo construímos uma grande amizade que permanece até hoje. Sempre estávamos juntos, em qualquer serviço que realizamos, quer na Padre Eutíquio, quer na Almirante Barroso, quando para lá depois nos transferimos. Lembro-me de irmos em sua “Lambreta” para fazer levantamentos topográficos: ele dirigindo e eu, na garupa, carregando o teodolito. Quase nunca nos tratávamos pelos nossos nomes e sim, apenas, por “Madeira”. Quando o Affonso começou a trabalhar na sede da Almirante Barroso, constituímos uma “trinca de Madeiras”. A amizade nossa era tão grande, que levei o Affonso para trabalhar comigo em meu Escritório de Cálculo Estrutural, que funcionava na casa do Leônidas Alves de Souza (acadêmico de engenheira), juntamente com o também acadêmico de engenharia Lauro Couiti Inagaki. Esse Escritório situava-se na hoje Avenida Magalhães Barata, próximo da Travessa Nove de Janeiro. Nessa altura, o Lindolfo não foi trabalhar comigo porque já trabalhava no Escritório Estrutural do Paulo Borges Leal. Por fim, falando nessa amizade, é oportuno registrar que, quando fechei aquele Escritório para ir para Brasília, o Lindolfo convidou o Affonso para trabalhar com ele e com o Paulo. Dessa união, surgiu a firma de engenharia deles, a PROJEN, que realizava cálculos estruturais, bem como incorporava e construía edifícios. As nossas aposentadorias no DMER decretaram a separação física dos “Madeiras”, porém minha amizade com eles permanece até hoje

Voltemos à sede da Padre Eutíquio. Foi durante a permanência do SMER nessa sede que foi iniciada a construção da Nova Estrada Belém-Icoaracy, sob a coordenação do Baganha, com a participação do Celestino, do Machado, do Dourado, do Magno e do Ortiz. Por sua vez, o Sílvio  e o Jofre  trabalharam no projeto de uma outra estrada, com uma única pista, a Estrada da Maracangalha [hoje, Avenida Júlio César ( )] para dar um novo acesso ao Aeroporto de Belém. Aliás, no começo da década de 1980, eu coordenei um novo projeto para essa estrada, desta vez com duas pistas que, no entanto, não foi executado por divergências com o Comando da Aeronáutica. O então Comandante não permitiu que uma mangueira, que se encontrava no eixo de uma das pistas e em seu início na Almirante Barroso, fosse derrubada. Apesar de haver sido sugerido, por um engenheiro civil (cujo nome não quero declinar por respeito a sua memória e aos seus descendentes), que eu desviasse o eixo para preservar a mangueira, não aceitei a imposição absurda. Hoje, como vemos, a Avenida Júlio César tem duas pistas, sem a mangueira, e com outro projeto que não foi o que coordenei. Creio ser oportuno destacar que o Dourado fundou e construiu, em 1967, a cidade dos trabalhadores – MONTE DOURADO – no Município de Almeirim, no Estado do Pará.

Foi na Sede da Padre Eutíquio que se deu a mudança de SMER para DMER, realizada pelo então Diretor Geral, o Bonna, em 27 de novembro de 1958, na Gestão do Prefeito Lopo Alvarez de Castro, conforme registro que fiz no artigo anterior. Aliás, é oportuno registrar que foi o Bonna quem, agora como Diretor Geral do DMER, assinou, no dia 17 de outubro de 1961, os Atos de Nomeação e Lotação dos seguintes Engenheiros Auxiliares: Bassalo, na Secção de Estudos e Projetos; Machado, na Secção de Construção; Dourado, na Secção de Máquinas e Equipamentos, e Sílvio, na Secção de Conservação. Todos esses Atos foram publicados no Diário Oficial do Município de Belém, do dia 27 de outubro de 1961. Foi ainda na Gestão do Dr. Lopo de Castro que, em dezembro de 1957, o então SMER construiu uma grande árvore de Natal, toda metálica, no Largo de Nazaré, sob a supervisão do ferreiro Ismaelino.

SEDE DO DMER NA AVENIDA ALMIRANTE BARROSO

Creio que foi no final de 1961, ou no começo de 1962, que o DMER foi precariamente instalado no local onde se situava o “britador” e a Oficina Mecânica, na Almirante Barroso, agora sob a Direção Geral do engenheiro José Maria Cordeiro de Azevedo, na Gestão do Prefeito Luís Geolás de Moura Carvalho. Aí, trabalhei com vários Diretores Gerais (anotados no artigo anterior) até me aposentar em março de 1985. Tentarei descrever algumas situações pitorescas que lá aconteceram durante esse período. Antes, registrarei os novos colegas. Na parte Técnica: os engenheiros Djalma Lobato Muller, Edson Augusto Freitas de Meira e Luiz Roberto Horácio Freire; os estudantes de engenharia Aldebaro Barreto da Rocha Klautau, Fernando Antonio Moreira Aflalo, José Augusto Soares Affonso, Paulo Gilberto Godinho da Ponte Souza e Paulo Sérgio Fontes do Nascimento; os topógrafos César Machado, Jacy Gonzaga da Igreja (depois, engenheiro), Jonas Viveiros de Abreu, Laurecy Oliveira da Silva e Raimundo Nonato Moreira Aflalo; os desenhistas Domingos Machado do Carmo (“Machadinho”), Edmar Batista de Souza (hoje, engenheiro), Ely Maria do Carmo Ferreira, Elivaldo Batista de Souza (hoje, médico), Geraldo Otávio Mergulhão de Oliveira (hoje, arquiteto), Odair Ferreira de Matos, Raimundo Cintra (“Jacaré”) e Ronaldo Mártires Coelho (hoje, engenheiro ambiental); os laboratoristas Carlos Ribeiro da Silva e João Ferreira de Andrade Filho; o auxiliar técnico Américo Ribeiro da Silva; na parte Administrativa: Aderval da Silva Santos, Armando (auxiliar de tesoureiro), Belmiro de Souza Ribeiro (“Biroba”), Eimar Tavares (também poeta), Itamor dos Santos Cruz (Sabrecado”), José dos Santos Rabelo, José Fabiano da Silva, João de Deus Pamplona da Silva, João Maximino Castro de Lima (pagador), Manoel Ferreira Lima, Marcos Alves da Rocha, Maria Priscila de Souza Raliffe (tesoureira), Mário Ribeiro de Azevedo Filho (economista), Oscar Mendes de Oliveira, Orlando de Andrade Rabelo, Raimundo Nazareno dos Santos Rabelo, Sebastião Lobato Cardoso, Selma do Socorro L. Pedrosa, Sílvio Marciano Gaia e Wilson Modesto Figueiredo (Diretor da Divisão de Finanças); na Secretaria da Diretoria Geral, na Assistência Técnica e nas Divisões e Seções Técnicas: Antonio Maria da Silva Serra, Carlos Augusto Correia Alves (secretário), Fernanda Miranda Tavares, Francisco Ferreira Carvalho, Luiz Antonio da Silva, Maria Celina Mattos Athayde, Maria de Nazaré da Silva Feio, Rosa Maria Nascimento de Souza, Terezinha de Jesus Amazonas Pedroso, o motorista da Diretoria Geral João Amaral, os contínuos Miguel Silva (“Biriba”), Mota, Raiol e Sebastião Lobato Cardoso (“Masca Rolha”), os vigias Felix e Sodré, e o protocolista Miguel Gomes Ferreira. Na Jurídica: Clóvis Modesto de Figueiredo e Salatiel Paes Lobo. No almoxarifado: Francisco Nunes Martins Filho, José da Costa Sampaio e José Lopes de Mendonça (“Perna Santa”); Bibliotecária: Haydée Coelho de Oliveira (indicada por mim para exercer esse cargo); no Setor Médico-Odontológico: os médicos Aramis Francisco Mendonça de Moraes, David Gabbay, Guilherme Chaves (“Doutor Amostra Grátis”), Hygino Manoel Valente Pampolha e Jassé Pereira; os dentistas Armando Batista de Miranda, Otávio Nunes Lamarão e Pedro Carlos Girard; os enfermeiros Maria de Fátima Teixeira, Lúcia, Vieira e Vítor Hugo Batista; e Júlio Veliz (o famoso goleiro do Remo), motorista da ambulância; no Serviço Social: Maria Baima Amorim e Maria de Fátima Ataíde Moreira Lima (também professora da UFPA). No serviço externo: Acácio, Luiz Antônio, Walter Wenceslau Batista (“Waltinho”), Guilherme Siqueira Marques, Olavo Cordeiro e Rui Marques. No setor de Máquinas e Equipamentos: Anacleto, Anézio Pereira da Costa (“Gorgulho”), Carlos Sena (“Chem-Chem”), Cleto da Costa Santos (“Fofo”), “Chico Teimoso”, “Chuim”, Elias Ferreira (“Raposa”), Jacob, João de Deus Bentes Pereira (“João Bomba”), Macêdo, Sebastião de Oliveira Furo (“Bigurrilho”) e Sérgio Magalhães Meirelis, os pedreiros Domingos Aracati Mendes, “Fofoca” e Raiol, os carpinteiros Astrogildo Bentes e Neovergildo Nascimento, Nilton de Figueiredo Teixeira (bombeiro hidráulico), Romeu Felipe Néri (operador do espargidor de asfalto), os capatazes Ailton (“Macaco Branco”), Álvaro Leal, Antonio Ramos, Astrogildo, Marcelino Balbino, “Ceará”, Faber, José da C. Sampaio, José João do Nascimento, “Merote” (que morreu esmagado por uma árvore quando participava do desmatamento da estrada de acesso para a Baía do Sol, no Mosqueiro) e Vitorino Pinheiro, o pintor Orlando Moura Carvalho, os motoristas Astrogildo Siqueira Bulhões, Domingos Rodrigues de Freitas (“Camarão”), João Brito, Joaquim Carrilho Neto (“Formado”), Juracy Vogado Abadessa (“Dadaia”), Luciano Amaro Ribeiro (“Jacurarú”), Rafael Bezerra (“Puxa-Faca”), Sebastião ramos do Carmo, Sebastião Viegas de Melo, Severino Vicente da Silva (“Peteleco”) e Vanor Ferreira Ramos, o braçal Eugênio Monteiro (“Cinco de Chouriço”), e o zelador Camilo Ferreira da Silva. Este colocava jias no pote de água para “gelá-la”, conforme me lembrou o Jacy Igreja.

É interessante registrar que, conforme chamou a minha atenção a bibliotecária Haydée, o Serviço-Social (criado pelo saudoso Dr. Alírio, em 1964), na ocasião em que o DMER foi extinto, em 31 de dezembro de 1989, tinha todo apoio assistencial, com ambulatório completo dispondo de reservado para repouso e observação do funcionário que passasse mal no decorrer do expediente, dois ginecologistas, dois dentistas, um clínico médico e duas assistentes sociais. Além do mais, havia um programa de distribuição gratuita de medicamentos por intermédio da Central de Medicamentos (CEME), música ambiental e café com leite. Creio ser ainda oportuno registrar que o lazer do funcionário era patrocinado pelo GRM, cuja sede ficava no Entroncamento; ela foi recentemente vendida e seu valor foi rateado pelos sócios que estavam quites com as mensalidades.

Aproveito a oportunidade para esclarecer que, apesar dos esforços da Haydée, do Ismaelino e do Jacy, não foi possível confirmar a locação e o nome completo de cada um dos “rodoviários municipais” citados até aqui. Desse modo, é possível que haja deslocamento de locações. Por isso, peço desculpas por esse possível desencontro, bem como por não registrar o nome completo de alguns companheiros e, de alguns deles, registrar apenas o apelido. Por fim, uma desculpa especial àqueles que foram esquecidos por mim, não por não serem merecedores dessas minhas lembranças, mas por absoluta ausência de registro em minha memória, em virtude de encontrar-me fechando a sexta década de minha vida.

Agora, contarei alguns fatos que marcaram a minha vida na sede da Almirante Barroso. Eu gostava muito de conversar com os motoristas e ouvir suas histórias. O Rafael, por exemplo, gostava de “enriquecer a realidade” nas histórias que contava. Uma delas, e das quais me lembro bastante, era a seguinte. Um dia, ele me disse: Doutor, ontem descobri a razão do tormento de um vizinho meu. Veja o senhor qual era o tormento dele. Toda a vez que ventava muito, durante um temporal, ele ouvia a seguinte música (que vinha de seu quintal). “Mamãe eu quero…, mamãe eu quero…, mamãe eu quero…”. Ele ficava intrigado, pois pensava tratar-se de uma “alma do outro mundo”. Ontem eu resolvi colocar isso em pratos limpos. Fui ao quintal dele e vi que a música que ele ouvia era porque a ventania fazia um talo de capim passar pelo pedaço de um disco da música “Mamãe Eu Quero”. Por isso o capim fazia o mesmo papel da agulha de uma eletrola. Doutor, o vizinho me agradeceu bastante pois agora ele podia viver em paz. Essa música, de autoria de Jararaca e Vicente Paiva, se tornara famosa por haver sido interpretada pela Carmen Miranda e pelo Bing Crosby. Certamente, uma hora dessas, o Rafael está contando suas “histórias mirabolantes” para São Pedro. Ele morreu esmagado pela basculante do caminhão que dirigia!

Outro motorista com quem eu gostava de conversar era o Peteleco. Contudo, diferentemente do Rafael, era completamente inconseqüente em suas atitudes. Ele não respeitava nem protocolo e nem hierarquia, conforme se pode ver na história que me foi contada pela Haydée. Um certo dia, ela estava na ante-sala da Assistência Técnica para falar com o Affonso, que era o Assistente Técnico. A Rosa, sua secretária, disse-lhe que o Dr. Affonso estava para sair e não poderia recebê-la. Quando ela se preparava para deixar a sala, entrou o Peteleco e disse para a Rosa que queria falar com o Affonso. Ela deu-lhe a mesma explicação que dera a Haydée. Ele, com a sua irreverência, adentrou a sala do Affonso. Deixo que a própria Haydée conte o desfecho dessa história.

O Peteleco era, por assim dizer, irreverente, inconveniente e insistente, quando queria falar com algum chefe, sempre para pedir ou reclamar algo. Certa vez, desejou falar com o engenheiro José Augusto Affonso e a secretária deste disse-lhe: “o Doutor está ocupado, não pode lhe receber agora”. Mas para o Peteleco não havia impedimento – para ele não existia protocolo, hierarquia, cerimonial ou “acesso proibido” – assim, adentrou o Gabinete do Affonso na Assessoria Técnica, pois ninguém conseguia contê-lo. Só saiu de lá porque o Affonso, para encerrar a visita indesejável e onerosa, saiu na frente. Na ante-sala ia chegando o Lindolfo e o Affonso disse a este: “Poxa, Lindolfo, arranje um médico para fazer uma eutanásia no Peteleco que eu não agüento mais”.

Presenciando essa atitude insólita do Peteleco, Haydée lembrou-se do aforisma usado por seu tio Waldir Machado Coelho: Felizes são os ignorantes. Certamente, o Peteleco deve ter entrado, sem permissão, várias vezes no céu para falar com Deus, apesar de São Pedro dizer para ele que o Supremo Arquiteto Criador do Mundo não podia recebê-lo por estar ocupado!

Voltemos à minha vida no DMER. Conforme registrei acima, logo que fomos transferidos para a Almirante Barroso, ficamos instalados precariamente em barracos de madeira, enquanto o Prefeito Moura Carvalho negociava com o Governador Aurélio do Carmo a cessão de um terreno estadual, ao lado de onde estávamos instalados, na esquina com a Rodovia do Utinga ( ), que tinha uma Caixa d´Água e um Posto Médico, ambos desativados. Cedido o terreno, e como eu trabalhava na Secção de Estudos e Projetos, fui designado pelo Diretor Geral, o Dr. Azevedo, para preparar o projeto para a Sede do DMER. Contudo, como ele era do DER/PA, colega do engenheiro civil Camilo Sá e Souza Porto de Oliveira, e considerando que este era famoso por haver inovado o projeto de casas em Belém e, também, por haver projetado o Edifício Sede do DER/PA, meu projeto foi substituído pelo projeto do Camilo. No entanto, eu realizei o seu cálculo estrutural (com a participação dos então acadêmicos de engenharia Affonso e Lindolfo), bem como iniciei a sua construção. Lembro-me de que esse cálculo foi um dos primeiros, em Belém, a considerar o “regime de ruptura”. Eu usava tabelas, em “cópias heliográficas”, pois ainda não haviam sido incorporadas em livros textos, principalmente a famosa coleção dos livros (3 volumes) Cálculo Prático de Concreto Armado, do Aderson Moreira da Rocha. Recordo-me de que essas tabelas foram obtidas pelo saudoso João Luís Barreiros de Araújo (ideólogo do Partido Comunista Brasileiro, em Belém) meu colega de turma na EEP, e que, nessa ocasião, começo da década de 1960, era meu sócio em um Escritório de Cálculo Estrutural.

Por ocasião da construção da Sede do DMER, aconteceu o Movimento Militar de 31 de março de 1964. Inicialmente, ele começou com a “caça aos comunistas e/ou subversivos”. Apesar de eu não ser um militante comunista, porém, como eu era sócio do João Luís e por defender sempre os fracos, mesmo quando não tinham razão, fui tachado de “comunista”. Para aquela caça, a cabeça era escolhida em reuniões realizadas no Quartel General, localizado na Praça da Bandeira. Um certo dia, um engenheiro civil (que não era do quadro do DMER e cujo nome prefiro não declinar, por respeito aos seus descendentes), entrou no DMER e falou-me: Bassalo, acabo de vir do Quartel Geral e vi teu nome citado como comunista. Logo serás preso. Eu retruquei: Fulano, quando começarem a prender corrupto, foge, pois serás o primeiro a ser preso. Aliás, era esse mesmo engenheiro que, toda a vez que entrava no DMER, me perguntava: Bassalo, tu és topógrafo?. Eu, que já era engenheiro e professor da então Universidade do Pará, sempre respondia: Fulano, dos livros que estudo, tu não passas da capa. Esse comentário irônico decorreu do seguinte fato. Eu e Lindolfo estávamos trabalhando no projeto de drenagem da Avenida Almirante Barroso. Para calcular a rede de escoamento das águas pluviais envolvidas nesse projeto, precisávamos traçar o perfil de todas as ruas que compunham essa rede. Em uma delas, em um determinado ponto de seu leito, pedimos ao “Chuim”, que conduzia a “mira falante”, para colocá-la em seu ombro. Quando fomos calcular a caderneta de campo para traçar o perfil, esquecemos de somar a altura de seu ombro na leitura que fizemos e, portanto, no perfil correspondente que traçamos, apareceu um “fictício” grande buraco. Quando aquele engenheiro olhou para o perfil, perguntou para nós: Que buraco estranho é esse que vocês encontraram? Vocês são topógrafos? Claro que percebemos o erro e fizemos a correção. Aliás, para o cálculo dessa drenagem, chegamos a preparar uma maquete com os perfis de todas as ruas envolvidas no projeto.

Sobre o “Chuim”, que sempre nos acompanhou em nossos levantamentos topográficos, o Jacy relata o seguinte. Ele gostava muito de tomar cervejas. Quando via um bar que vendia “geladas”, aproximava-se do proprietário e dizia que o comércio dele ia ser afetado pelo alargamento da rua em que estávamos fazendo o levantamento. Ele, marotamente, prometia ao comerciante que iria conversar com a equipe de topógrafos para fazer um novo projeto, livrando o seu comércio. Em troca dessa oferta, ele tomava algumas “geladas”.

Creio que, quem acompanha essas minhas Memórias, deve ter percebido que essa minha irreverência virulenta não respeitava nem meus diletos amigos. Mais adiante, terei oportunidade de registrar outros aspectos dessa irreverência desrespeitosa, no DMER.

Voltemos ao Movimento Militar. Quando este começou a caçar “corruptos”, por volta de junho de 1964 e obedecendo ao Comando Geral de Investigações (CGI), o Governador Aurélio do Carmo e o Prefeito Moura Carvalho foram cassados, assim como seus comandados. Desse modo, o Dr. Azevedo foi substituído pelo Dr. Alírio. Sem justificativa, já que nunca fui molestado por esse Movimento, em Belém, fui substituído pelos engenheiros Ocyr e Jofre, na continuação da construção do Edifício-Sede. Como essa construção situava-se transversalmente à direção do eixo da Pista de Pouso do Aéreo Clube e o Brasil estava a “manu militari”, Camilo e eu, pela parte da manhã, fomos ao então Brigadeiro Comandante da Zona Aérea de Belém (de cujo nome não recordo), para saber se a altura (dois andares) do prédio que estávamos construindo não prejudicava as operações daquela Pista. Depois de liberar a construção, mandou o seguinte recado para o Dr. Alírio: Se em sua saída do Comando, por volta de meio-dia, ainda estivesse na frente da construção a placa do nome do Governador corrupto, ele mandaria prendê-lo. Creio que o leitor deva ter uma explicação com relação a essa placa. Como o Governo do Pará havia cedido o terreno para essa construção, conforme registramos antes, essa placa agradecia ao Governador essa concessão. É ainda oportuno relatar que, no começo do Movimento Militar, o Comandante e o Governador sempre estavam juntos, inclusive porque privaram de uma certa amizade anterior a esse evento. Devo registrar que o Dr. Alírio, ao ouvir nosso relato da conversa com o Brigadeiro, mandou retirar a referida placa.

Ainda com relação ao comportamento dos Brigadeiros Comandantes da Zona Aérea de Belém, vou relatar um outro acontecimento inusitado. No terreno da Aeronáutica próximo da Pista de Pouso do Aéreo Clube, existia um campo de golfe onde os militares jogavam. Ele ficava no prolongamento do eixo da Estrada da Sacramenta ( ), hoje Avenida Senador Lemos. Quando o Dr. Deusimar Macedo era Diretor Geral do DMER, na Gestão do Prefeito Nélio Lobato, houve a tentativa de prolongar essa Estrada até o Entroncamento, objetivando uma outra alternativa de saída de Belém. Nessa altura, havia apenas duas saídas de Belém: Almirante Barroso e Avenida Pedro Álvares Cabral. Aliás, esta havia sido construída no leito do antigo ramal da Estrada de Ferro de Bragança, ligando Entroncamento ao Cais do Porto. Creio ser oportuno anotar que, quando o Dr. Maluf Gabbay foi Diretor Geral do DMER, houve uma tentativa de uma outra saída de Belém, desta vez pela Avenida Primeiro de Dezembro ( ), no trecho Avenida Dr. Freitas-Entroncamento. Contudo, ela foi inviabilizada por não ser possível contornar as seguintes dificuldades. O eixo inicial que eu projetara, cortava o Estande de Tiros do Exército, na Rodovia do Utinga. Quando desviei o eixo para a esquerda, ele cortava o Hospital da Aeronáutica. Por fim, ao desviá-lo para a direita, ele atingia os mananciais de água do então Departamento de Águas e Esgotos (DEA).

Por ocasião da ação da CGI no DMER, houve um caso inusitado, lembrado pelo Ismaelino. Como lá trabalhava o pintor Orlando Moura Carvalho, conforme já referi, ele foi chamado para depor perante aquela Comissão, na suposição de ser parente do Prefeito que havia sido cassado.

Voltemos ao caso do prolongamento da Estrada da Sacramenta. Conforme descrevi acima, esse prolongamento passava pelo campo de golfe dos oficiais da Aeronáutica. Como não houve permissão para esse prolongamento, um certo dia o Dr. Deusimar chamou-me e pediu que, no dia seguinte bem cedo, eu fosse com ele até o final daquela Estrada, próximo da Rua Alferes Costa, para, junto com o Prefeito Nélio Lobato, encontrarmos uma saída para esse impasse. Recordo-me de que o Coronel Lobato pegou um graveto e, no chão batido, desenhou uma circunferência, que representava a intercessão da Avenida Pedro Álvares Cabral com a Avenida Maracangalha (hoje, Júlio César). Virou-se para mim, e disse: O senhor pode desviar o eixo da Sacramenta, para evitar o campo de golfe, e traçar uma tangente a essa circunferência. Respondi-lhe, secamente: Em que ponto dessa circunferência, uma vez que a mesma possui uma infinidade deles?. É claro que não houve resposta. Quando continuamos a caminhada pela Rua Alferes Costa, em uma estiva de madeira, ouvi ele perguntar ao Dr. Deusimar: Quem é esse engenheiro?. Ele respondeu, sussurrando: Ele também é físico nuclear! Creio ser oportuno dizer que, até o presente momento, a Sacramenta (atual Avenida Senador Lemos) termina na frente do Terminal de Embarque-Desembarque do Aeroporto Júlio César, o nome atual do Aéreo Clube, porém não existe mais o campo de golfe. Aliás, o Paulo Sérgio lembrou que o então Brigadeiro Comandante da Zona Aérea de Belém havia concordado em fazer a ligação pensada pelo Prefeito Nélio logo que concluíssemos a Sacramenta. Contudo, na conclusão, ele não permitiu que a ligação fosse feita, impedindo-a com barricadas controladas por soldados da Aeronáutica!

Ainda como reminiscências de minha vida como engenheiro rodoviário, vou relatar duas de minhas irreverências com o meu amigo-irmão Loriwal. Quando Prefeito de Belém, ele sempre ia ao DMER, cujo Diretor Geral era o Dr. Ramiro. Em uma dessas visitas, na sala da Diretoria Geral, estávamos discutindo a Guerra das Ilhas das Malvinas/Falkland, ocorrida entre a Argentina e a Inglaterra, entre 2 de abril e 20 de junho de 1982. No aceso dessa discussão, eu disse que essa Guerra decorria por causa da existência de petróleo submarino, em suas proximidades. Um dos participantes dessa discussão, que não era o Loriwal, virou-se para mim e disse: Esse argumento é coisa de comunistas. Eu então respondi: Se vocês têm tanta raiva de comunistas, pois bem, tenham raiva de mim, pois eu também sou comunista. E sai bruscamente daquela sala. Como esse incidente ocorreu por volta de meio-dia, dirigi-me para a minha casa, na Avenida Governador José Malcher, 629, usando, como quase sempre fazia, o transporte coletivo.

Quando me aproximei de casa, vi o carro-oficial da Prefeitura estacionado na sua frente. Ao entrar, fui recebido, no corredor de entrada, pelo meu saudoso sogro, professor Machado Coelho, com quem morava. Ele me disse: O que você fez com seu amigo Loriwal. Ele está na varanda aflito e lhe esperando. Quando ele me viu, levantou-se da cadeira, deu-me um abraço e disse: Chenca, eu só vou almoçar se você me desculpar pelo que aconteceu agora no DMER. Disse-lhe: Que é isso Loriwal, você não tem nada o que se desculpar. Eu sim é que tenho de pedir desculpas a você, pois fui muito grosseiro, saindo abruptamente sem me despedir de você.

Nessa mesma varanda, ocorreu uma outra grosseria minha com o Loriwal, ainda Prefeito. No final de seu mandato, houve necessidade de trocar o Dr. Ramiro da Direção Geral do DMER. Ele então, em nome de nossa velha amizade, foi em casa para me convidar para substituir o Dr. Ramiro. Grosseiramente, disse-lhe: Loriwal, eu não vou em fim de festa. Se você quisesse, teria me convidado logo no começo dela. Ele então me perguntou: Quem, então, devo convidar. Respondi-lhe: O Affonso! E assim ele fez. Naquela altura de minha vida, eu não havia percebido que existe uma grande diferença entre QUERER E PODER. Certamente o Loriwal pensou em mim logo que foi indicado para a Prefeitura de Belém, para a Direção do DMER; contudo, o estigma que carregava de ser “comunista” talvez houvesse sido usado para o convite não ser formalizado. Aliás, devo registrar, en passant, que foi esse mesmo estigma que não permitiu que o engenheiro civil Fernando Guilhon, então Governador do Pará, me indicasse para ser Membro do Conselho de Cultura do Estado do Pará, segundo contou-me a minha amiga (e da família Machado Coelho), professora Walkyria Mello, recentemente falecida.

Nesta oportunidade, gostaria de fazer um comentário sobre um outro aspecto da seriedade com que os dirigentes (técnicos e administrativos) do SMER/DMER conduziam os serviços públicos por eles realizados. Quando o Dr. Ájax assumiu a PMB, em 1976, convidou o Sílvio Aflalo para ser Diretor Geral do DMER. Nessa época, este Órgão Municipal Rodoviário estava realizando uma série de obras, das quais destaco as construções da Rodovia Augusto Montenegro ( ) (hoje, Avenida Augusto Montenegro que dá acesso para Icoaraci) e Rodovia Perimetral ( ) (hoje, Avenida Bernardo Sayão), bem como as terceira e quarta pistas da Avenida Almirante Barroso. Para assegurar a qualidade desses serviços, o Sílvio contratou a firma W. J. Britto Consultoria, para fazer o controle técnico dos pavimentos dessas estradas. Recordo-me da solução (registrada no artigo anterior) dada pelo dono dessa empresa, o engenheiro paraense Washington Juarez da Silveira Britto, especialista em pavimentação e funcionário do DNER, no Rio de Janeiro, para o pavimento da Bernardo Sayão: brita graduada. Ele permanece até hoje. Além disso, as deformações das bases dos pavimentos dessas obras eram controladas por um dispositivo conhecido como viga Benckelman. Esse dispositivo foi muito usado pelo Antonino Amorim e pelo Paulo Sérgio, na construção da Avenida Augusto Montenegro.

Ainda sobre a preocupação de realizar serviços com alta qualidade técnica, o Paulo Sérgio lembrou de vários aspectos dessa postura. Por exemplo, o perfeito controle do pavimento de concreto da Avenida Almirante Barroso permitiu que, recentemente, fosse feito o revestimento em Concreto Betuminoso Usinado a Quente (CBUQ) dessa Avenida, sem apresentar nenhum recalque. Por outro lado, a primeira obra em aterro hidráulico feita em Belém, na Avenida Pedro Álvares Cabral, no trecho Doca Souza Franco-Coronel Luiz Bentes, esteve sob a responsabilidade do Paulo Sérgio. Aliás, a técnica usada nesse tipo de aterro foi utilizada pela UFPA na construção de seu Centro Tecnológico. Houve também dois rebaixamentos de lençóis freáticos, na Senador Lemos (próximo da Ponte do Galo) e na Avenida Augusto Montenegro, nos trechos da Nova Marambaia e da Cacilda, onde hoje está instalada a ESTACON. O primeiro deles foi realizado pelo Amorim e pelo Paulo Sérgio; o segundo teve a coordenação do Paulo Sérgio. Registro que esses rebaixamentos corrigiram as saturações dos pavimentos anteriores. Por fim, o projeto de drenagem da Avenida Almirante Barroso realizado por uma equipe da Seção de Estudos e Projetos do DMER (Affonso, Paulo Gilberto, Elivaldo, Jonas e Reis), sob a minha coordenação, foi usado por muito tempo nas aulas sobre projetos de estradas, no CT/UFPA, sob a orientação do Paulo Sérgio.

É evidente que vivenciei outras situações no SMER/DMER, algumas delas já registradas em outros artigos destas minhas recordações, outras que são inoportunas ou não são relevantes, e outras esquecidas em alguma parte de meu inconsciente, porém vivas na memória de alguns de meus amigos. Desse modo, vou concluir essas minhas reminiscências relativas ao meu exercício de engenheiro rodoviário, apresentando um resumo de minha atividade no SMER/DMER, acrescentando outras informações ainda não registradas neste artigo. Com efeito, em 2 de fevereiro de 1959, fui contratado como Engenheiro, sendo efetivado nesse cargo em 17 de outubro de 1961, conforme relatei acima. Em 31 de julho de 1964, respondi interinamente pela Divisão de Construção. Em 18 de maio de 1967, fui nomeado Engenheiro Nível 22 pelo Diretor Geral do DMER/Bl, engenheiro civil Maluf Gabbay. Em 14 de julho de 1967, o Dr. Maluf designou-me para representar o DMER no 3o Simpósio de Pesquisas Rodoviárias, realizado no então Estado da Guanabara. Em 23 de outubro de 1969 respondi interinamente pela Assistência Técnica. Em 20 de fevereiro de 1970, fui designado para responder interinamente pela Direção Geral do DMER, pelo então Prefeito de Belém, o advogado Stélio de Mendonça Maroja. Em 25 de março de 1970, fui nomeado Chefe da Seção de Estudos e Projetos do DMER pelo Diretor Geral, engenheiro civil Mariuadir Santos. Em 16 de junho de 1970, fui nomeado Diretor Geral do DMER pelo Prefeito de Belém, o engenheiro e Capitão Mauro Porto. No dia 28 de julho de 1970, fui designado Assistente Técnico pelo Diretor Geral, engenheiro civil José Augusto Soares Affonso. Voltei a chefiar a Secção de Estudos e Projetos no dia 1 de julho de 1971. Em 11 de abril de 1972, fui designado para chefiar a Secção de Pavimentação. Em 4 de setembro de 1974, fui colocado à disposição da Universidade Federal do Pará, por atos assinados pelo Prefeito, o médico Octavio Bandeira Cascaes, pelo Reitor, o advogado Clóvis Cunha da Gama Malcher, e pelo Diretor Geral do DMER, engenheiro civil Ramiro de Nobre e Silva. Em 20 de julho de 1979, passei a responder pela chefia da Secção de Planejamento e Estatística. Por fim, voltei a ser Chefe da Secção de Estudos em 13 de fevereiro de 1981, ficando nela até me aposentar no dia 21 de fevereiro de 1985.

Creio ser oportuno fazer um pequeno comentário sobre o extinto Instituto de Pesquisas Rodoviárias (IPR), ligado ao então Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq). Quando o Dr. Alírio era Diretor Geral do DER/PA, indicou o Antonino Amorim como Delegado do Núcleo desse Instituto para o Estado do Pará. Essa indicação teve imediato apoio do Dr. Maluf, então Diretor Geral do DMER. Durante os sete anos de existência do IPR, ele promoveu vários cursos na área de Engenharia Rodoviária em todo o Brasil, objetivando reciclar os profissionais rodoviários brasileiros. No Pará, o Amorim trouxe renomados especialistas que, junto com alguns engenheiros paraenses (por exemplo, Amorim, Paulo Sérgio e o saudoso Antônio Wilson Tavares), ministraram cursos de pavimentação. Eu próprio, em 1970, ministrei um curso de Métodos Matemáticos da Engenharia, para o qual preparei Notas de Aulas, em dois volumes, com cerca de 250 páginas. Lembro-me de que o Teste Final de aproveitamento foi realizado no dia 29 de dezembro de 1970. Segundo me informou o Amorim, esse Curso recebeu um elogio do engenheiro relator por ocasião de uma das reuniões do Conselho Consultivo do IPR, no Rio de Janeiro. O Amorim também me lembrou, por e-mail, de que o Tavares sempre teve um bom relacionamento profissional e de amizade com os engenheiros do DMER, principalmente na utilização do laboratório do então Segundo Distrito Rodoviário do DNER (hoje, DENIT), auxiliando na complementação de estudos de solo e asfalto para as obras rodoviárias municipais. O Amorim acrescentou que o Tavares, nos cursos que ministrava pelo IPR, em Belém e no resto do Brasil, falava sobre a pesquisa inédita, no Brasil, que realizou no Laboratório de Solos do DNER sobre o comportamento de solos lateríticos estabilizados, quando homogeneizados com água enriquecida com determinado teor de ferro. Essa pesquisa do Tavares sobre a influência microbacteriológica da laterização de um solo tropical foi tão importante que, durante muito tempo serviu de referência aos estudos efetuados pelos professores Jaques Medina, da UFRJ, e Job Shuji Nogami, da USP, sobre esse tipo de solo.

Durante o período (1954-1985) em que trabalhei no SMER/DMER, participei de várias de suas atividades técnicas, como os levantamentos topográficos e projetos (alguns deles sob a minha coordenação) da Rede Rodoviária desse órgão, quer na cidade de Belém, bem como nos distritos de Icoaracy, de Outeiro e de Mosqueiro. No projeto da Auto-Estrada Almirante Barroso (terceira e quarta pistas), fui também o coordenador do cálculo estrutural de seu pavimento e do projeto de sua drenagem, no trecho entre a Praça do Operário (“Largo de São Braz”) e Avenida Tavares Bastos. Para essa mesma Auto-Estrada, agora com duas pistas em pavimento asfáltico e no trecho entre a Avenida Tavares Bastos e o Entroncamento, além de coordenar o seu projeto, participei ainda da fiscalização de sua construção. Também participei da fiscalização das construções (além da coordenação de seus projetos) da Avenida Bernardo Sayão (“Estrada Nova”), em dois de seus trechos: Avenida José Bonifácio e Travessa do Jurunas (hoje, Avenida Roberto Camelier) e Rua Cesário Alvim-Praça do Arsenal de Marinha, e da Estrada 40 Horas ( ), no trecho Coqueiro-Granja Vivará. Os projetos das Avenidas Pedro Álvares Cabral ( ) e Perimetral ( ), ambos coordenados por mim, envolviam a construção de uma ponte, respectivamente, sobre os Igarapés Una e Tucunduba. Por ocasião da construção delas, ajudei o Lindolfo Campos na sua fiscalização. Por fim, conforme registrei anteriormente, fui o coordenador do cálculo estrutural do Edifício-Sede do DMER, na Avenida Almirante Barroso, onde hoje se situa a Secretaria de Saneamento da Prefeitura de Belém (SESAN).

É oportuno registrar que, desde o final da década de 1990, eu, Bonna, Machado, Moura e Sílvio (e, eventualmente, algum outro colega, não todos ao mesmo tempo, como o Baganha, Epitácio, Freire, Igreja, Loriwal, Marciano e Ronaldo) nos reunimos às sextas-feiras, em um almoço quinzenal. Inicialmente, esse almoço acontecia no Restaurante da sede social do Clube Assembléia Paraense. Contudo, com o seu fechamento, passamos a nos reunir no Restaurante do Clube do Remo. Agora, nos reunimos na Estação Gourmet ao lado da Basílica de Nazaré. Esporadicamente, também nos reunimos em outros restaurantes.

B.ENGENHARIA CIVIL/ESTRUTURAL

Conforme registrei acima, entrei na EEP em 1954. Meu primeiro contato com o outro ramo da Engenharia, com o qual lidei por algum tempo, a ENGENHARIA ESTRUTURAL, aconteceu em 1956, então aluno do 3o. ano do Curso de Engenharia Civil. Esse contato deu-se por haver sido solicitado a fazer um acréscimo, na casa de uma família minha amiga, o saudoso casal Saulo e Elvira Freitas, localizada na Praça Batista Campos. Para realizar tal acréscimo, precisava calcular uma pequena estrutura de concreto armado composta de laje, viga e pilar. No entanto, como só conhecia a Resistência dos Materiais, graças à disciplina que estava cursando na EEP, com o saudoso e querido mestre Rui da Silveira Britto, fui à casa do Dr. Baganha para que me auxiliasse nesse cálculo. Baganha, então, apanhou o livro Calculista de Estruturas, de Simon Goldenhórn, e fizemos o cálculo.

No ano seguinte, já aluno do professor João Lima Paes, comecei a estudar o cálculo formal de Estruturas de Concreto Armado na disciplina que ele então lecionava – Estabilidade das Construções – disciplina que me foi muito proveitosa, pois aprendi bastante a respeito de cálculo estrutural. Pois bem, então nesse mesmo ano de 1957 defrontei-me com o meu primeiro grande desafio: o cálculo de uma estrutura de concreto armado completa (sapata, pilar, laje e viga), para um prédio de dois andares que meu grande amigo e saudoso colega de turma, o engenheiro Laurindo Antônio Gonçalves de Amorim e seu cunhado, o então acadêmico de engenharia Almir Rodrigues, iriam construir na Senador Manoel Barata, como de fato construíram. (Hoje, no térreo desse prédio, está instalado o “Restaurante Sinhá”.) Nesse cálculo, tive a grande ajuda de um outro amigo, o Barcessat, meu colega no então SMER, conforme referi anteriormente. Com Barcessat aprendi muitos macetes do cálculo de concreto armado.

Porém, o grande desafio de minha vida como calculista de concreto armado aconteceu no começo da década de 1960. Foi o delineamento e cálculo das estruturas que compõem a Sede Campestre da Tuna Luso Brasileira (TLB), tais como: piscina olímpica com 50 m de comprimento e 4,50 m de profundidade em sua parte mais funda; arquibancadas, uma em quadro e a outra com um imenso balanço; trampolim de 10 m de altura. (Também foi engenheiro desta obra o Amorim, ainda auxiliado pelo Almir, tendo o Sr. Waldomiro Martins Gomes, recentemente falecido, como Presidente da Comissão de construção dessa Sede.) Pois bem, lembro-me de que, para calcular a arquibancada em quadro, tive de resolver um sistema de 13 equações a 13 incógnitas, no “braço”, apenas com auxílio de um algoritmo que tive de aprender na ocasião para resolver esse problema. Nessa época eu não sabia trabalhar com matrizes e nem havia ainda sido construído, no mundo, o computador personalizado, o famoso PC (“Personal Computer”). Esse computador é hoje indispensável em qualquer Escritório de Engenharia.

Creio ser oportuno registrar um episódio ocorrido por ocasião da construção da piscina da Tuna. Para receber o excesso de água de sua borda, projetei uma canaleta ligada à parede vertical da piscina, porém em balanço. Em sua execução, usamos (eu, Amorim e Almir) cacos de tijolos para fazer o concreto. A variação de temperatura provocou dilatações diferentes nos dois concretos, o de brita, usado na estrutura da piscina, e o de cacos, usado naquele dispositivo, provocando uma fissura superficial na junção dos dois, sem, contudo, ameaçar a sua estabilidade. No entanto, essa fissura preocupou o Sr. Waldomiro. Este, aproveitando a vinda do engenheiro estrutural, o alemão Bondra, que trabalhava em uma firma inglesa, a Byngton, e que projetara a estação de tratamento da piscina, perguntou-lhe sobre o perigo dessa fissura. Ele respondeu que não havia perigo nenhum pois era normal acontecer esse tipo de fissura. Recordo-me bastante desse fato, pois caminhávamos (Sr. Valdomiro, ele e eu) sobre a canaleta quando a pergunta foi feita.

Aliás, por falar nesse engenheiro, lembro-me bastante dele pela seguinte situação. A Sede da Byngton era na Rua Bailique (hoje, Ferreira Cantão), próximo da Igreja da Trindade. Nas décadas de 1950 e 1960, essa firma realizou uma série de serviços de água e saneamento para o então Departamento Estadual de Águas (DEA). Nessa ocasião, eu havia sido contratado para calcular a Casa de Máquinas desse Departamento, situada no Largo de São Braz. No pequeno bangalô em que funcionava aquela firma, trabalhávamos todas as tardes, ele e eu, em pranchetas distintas. Ele chegava, colocava o papel vegetal na prancheta, pegava uma régua de cálculo, o livro Beton Kalender e uma garrafa de uísque. Ele realizava os cálculos estruturais usando esse livro, a régua de cálculo e um gole do escocês (não recordo se era legítimo, provavelmente era). No final da tarde, terminava o cálculo e secava a garrafa. Enquanto viveu, nunca desabou nenhuma estrutura que ele calculou, pelo menos que eu saiba.

Depois do desafio das estruturas da Sede Campestre da Tuna anteriormente relatado, outros aconteceram, dentre os quais destaco alguns deles. 1) Cálculo de concreto armado em regime de ruptura. Com esse método, eu e João Luís calculamos o Edifício Nuno Álvares (Rua Senador Manoel Barata com a Travessa Primeiro de Março), e eu calculei o Edifício-Sede do DMER/Bl, conforme já mencionei; 2) Estruturas especiais em fundações do tipo viga-alavanca, como as do Edifício Leão da América (Avenida Portugal) e do Edifício da Justiça do Trabalho, Primeiro Bloco (Praça Brasil), calculadas por mim e pelo Fausi Sanjad, meu colega de turma da EEP; 3) Sapatas apoiadas em estacas de concreto armado, como o cálculo que fiz para as fundações do Edifício-Sede do BASA (Avenida Presidente Vargas com a Rua Carlos Gomes). Recordo que a estrutura em concreto armado desse prédio havia sido calculada pelo engenheiro carioca Aderson Moreira da Rocha. Recordo, também que, para realizar esse cálculo, usei o livro intitulado Fundações, do Nuno Monteiro; 4) Caixa d´água com geometria arrojada (tronco de cone invertido), como a da fábrica da Companhia de Aniagem e Tecelagem da Amazônia (CATA), no final da Rua Cesário Alvim com a Estrada Nova, de propriedade de Waldomiro Gomes. Esta fábrica foi construída pelo Amorim e Almir; 5) Marquise na forma de uma serra dentada da Igreja Santa Cruz, na Avenida Almirante Barroso..

Além dos cálculos estruturais especiais destacados acima, realizei os cálculos estruturais comuns de vários Edifícios: Irmãos Martins (Praça Brasil), Selecto (Avenida Presidente Vargas), Hotel São Geraldo (Rua Padre Prudêncio), Hotel Vanja, Primeiro Bloco (Travessa Benjamin Constant), Ismênia (Avenida Gentil Bittencourt), Tocantins (Avenida Governador José Malcher), Marabá (Rua Dom Romualdo de Seixas), Santarém (Avenida Conselheiro Furtado, onde morei quando me casei), Panificadora Vitória (Rua Treze de Maio), Francisco Carrapatoso (Travessa Primeiro de Março), e mais os prédios de dois andares situados nas seguintes localidades: Rua Senador Manoel Barata, 1020; Travessa Primeiro de Março, 625, Senador Manoel Barata com a Travessa Quintino Bocaiúva, e Rua O´ de Almeida, 562 (com o Fausi). Calculei também a Casa de Máquinas do DAE (conforme referi antes), as fundações de apoio do forno das Perfumarias Phebo, na Quintino Bocaiúva com a O´ de Almeida, e o Edifício Atlântico (com o Wilson Constantino, meu colega da EEP), em Salinas. Devo destacar que a maioria desses cálculos estruturais eu os realizei no Escritório de Engenharia do Amorim e do Almir, inicialmente instalado em uma das salas no térreo do Hotel da Paz (gerenciado pelo pai do Amorim), onde hoje se localiza o BASA. Depois, passamos para o barracão de construção do Edifício Assembléia Paraense (calculado pelo famoso engenheiro brasileiro Antônio Alves de Noronha), e finalmente para uma sala térrea deste Edifício, quando se encontrava em acabamento. Creio ser oportuno dizer que Amorim e Almir construíram a maioria desses edifícios, tais como: Leão da América, Justiça do Trabalho, Irmãos Martins, Selecto, Hotel São Geraldo, Francisco Carrapatoso e Assembléia Paraense, além da Panificadora Vitória. Registro ainda que calculei a estrutura em concreto armado da nova sala de cirurgia do Hospital da Beneficência Portuguesa, também construída pela dupla Amorim e Almir. Nessa altura, no início da década de 1960, eu não sabia que nessa mesma sala, em 1980, seria operado de hemorróidas, pelo estimado amigo, o competente cirurgião Dr. Guilherme Guimarães.

Nos trabalhos referidos acima, o dimensionamento das peças estruturais e o respectivo cálculo das ferragens foram feitos usando, basicamente, a famosa coleção de livros intitulada Curso Prático de Concreto Armado (3 Volumes), do professor Aderson. Contudo, para a obtenção dos momentos fletores das vigas contínuas, eu fui um dos primeiros calculistas em Belém a usar um método analítico, o método de Cross, cujos primeiros estudos foram feitos, em parceira com o João Luís, no livro La Méthode de Cross et le Calcul Pratique des Constructions Hyperstatiques – Théorie et Applications (Editions Eyrolles, Paris, 1960), do engenheiro francês Pierre Charon. Registro que, por essa época em Belém, os engenheiros calculistas usavam um método gráfico, o método dos pontos fixos. Registro também que, apesar de eu haver realizado, juntamente com outros engenheiros civis, um Curso de Concreto Protendido com o professor Aderson, em julho de 1969, patrocinado pelo então Instituto de Pesquisas Rodoviárias (IPT), no Edifício-Sede do então DER/PA, eu nunca fiz nenhum Cálculo Estrutural usando essa nova Tecnologia. Em 1969, eu já havia encerrado minha carreira de calculista estrutural, para me dedicar ao estudo da Física, conforme relatarei a seguir.

No começo de 1965, suspendi minhas atividades como engenheiro e fui para a Universidade de Brasília (UnB) objetivando estudar Física. Contudo, devido à crise que ocorreu nessa Universidade (ver relato dela em outro artigo destas minhas Memórias), voltei para Belém. Meu grande amigo e ex-aluno, o saudoso Guilherme Maurício Souza Marcos de La Penha, responsável pela criação do Programa de Engenharia Mecânica da Coordenação dos Programas Pós-Graduados de Engenharia (COPPE) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), sabedor dessa minha frustrada ida para Brasília e lembrando que eu era Engenheiro Estrutural, convidou-me para fazer mestrado no Programa de Engenharia Civil, coordenado pelo seu amigo, o engenheiro civil Luiz Bevilacqua. Apesar de haver recebido uma Bolsa de Estudos da Coordenação do Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), a partir de março de 1967, por um período de dez meses para fazer o Mestrado em Estruturas, na COPPE, e sob a orientação do professor Bevilacqua, uma crise de minha hipocondria neurótica (iniciada em 1948 e da qual falei em outro artigo dessas minhas reminiscências) impediu-me de realizar esse Mestrado. Passada aquela crise, e atendendo ao convite do professor Jayme Tiomno (quem, aliás, levou-me para a UnB), em 1968, decidi ir para a Universidade de São Paulo (USP) e retomar meus estudos de Física. Essa decisão sepultou a minha carreira de Engenheiro Estrutural. Na USP, obtive o Mestrado em 1973 e o Doutorado em 1975, sob a orientação de meu amigo-irmão, o professor Mauro Sérgio Dorsa Cattani.

Para concluir a minha saga na Engenharia Civil, vou falar das construções civis que realizei. No final de 1958, já formados, eu e o José Maria Pinheiro de Souza, meu colega de aula e de estudos da EEP, montamos um efêmero Escritório de Engenharia na Travessa Sete de Setembro, próximo da Rua Treze de Maio. Como o Pinheiro começou logo a trabalhar no Serviço de Navegação e Administração do Porto do Pará (SNAPP), fechamos esse escritório. Aí, então, juntei-me com o Fausi e com o Wilson e, juntos, com uma firma denominada Sigma Construções, iniciamos, em 1959, a construção de uma casa na Travessa São Pedro, próximo da Avenida Almirante Tamandaré, em um loteamento que havia sido projetado pelo engenheiro civil Feliciano Seixas, nosso professor na EEP, e construtor do então mais alto edifício do norte do Brasil: Manoel Pinto da Silva. A casa referida, de propriedade do francês George Gousil (amigo de meu futuro sogro, professor Machado Coelho), foi a primeira residência em Belém cujas fundações foram realizadas com estacas do tipo “Strauss”, cravadas pela firma pernambucana Solos Serviço Brasil-Norte, de David Augusto Santini e do engenheiro civil Sérgio Tonin. Registre-se que essa firma veio para Belém para fazer o estaqueamento do Edifício da Caixa Econômica Federal do Pará, na Avenida Presidente Vargas, ao lado do Edifício Assembléia Paraense. Ainda em 1959, eu construí a residência da tia Júlia de meu amigo Lourival Barbalho, na Avenida Generalíssimo Deodoro, próximo da Rua Diogo Moia, sendo o Haldone Fonseca o meu Mestre de Obras. Em 1960, eu construí uma residência para o Senhor Samuel José Benzecry, na Rua Arcipreste Manoel Teodoro 815, destinada à moradia de sua filha Ester, que estava noiva com o engenheiro civil Ramiro Bentes e com o casamento marcado para junho de 1961. Aliás, foi por ocasião da construção dessa casa que tive uma experiência inusitada na minha vida de Engenheiro Estrutural. No projeto que elaborei para essa residência, desenhei uma escada cujos degraus se engastavam em uma peça central em forma de espiral, de eixo inclinado, apoiada em uma sapata e na laje do segundo piso. Como eu não sabia calcular esse tipo de estrutura, coloquei ferro em todo o perímetro dessa peça para absorver todos os esforços de tração que pudessem ocorrer nela, deixando ao concreto a absorção dos esforços de compressão. Ela ainda está em pé.

Em 1960, meu colega no DMER, o engenheiro civil Moisés Benchimol, convidou-me para ser seu sócio na construção de uma vila de 12 casas na Travessa Caripunas, número 1760, de propriedade de Alfredo José Salame. Este havia recebido a indicação do Moisés por intermédio de um amigo comum deles, o saudoso Henrique Resende, conhecido jornalista paraense. Como eu já tinha experiência em construção civil, aceitei o convite do Moisés e levei o Haldone para ser o Mestre de Obras. Durante essa construção, reunimos vários operários, dentre os quais, registro os nomes dos pedreiros, os irmãos Xavier [Francisco (“Ceará”), José (“Zé Bam-Bam-Bam”), Milton (“Cearazinho”) e Antônio (“Velho Antônio”) e seu filho Antônio Filho (Bicudo“)], José Mesquita (“Zé Pretinho”), Gilberto Nunes (“Vavá”), Oscarino Pinheiro e “Fuinha”, os carpinteiros Braz (“Caboclo”) e “Caripunas”, e os serventes “Toledo”, Epifânio (“Camarão”), “Javali”, Francisco Santos (“Gordinho”) e Raimundo Alves (“Sônia”), todos eles lembrados pelo Haldone. Recordo que, na construção dessas casas, o barro, a areia e a pedra preta foram fornecidos pelo Dr. Baganha que, nessa época, tinha uma pequena empresa de venda de material de construção.

As doze (12) casas eram assim divididas. Seis (6) casas de cada lado de uma rua central. As duas que davam para a Caripunas eram de dois andares, e as quatro restantes, de um andar. Como o terreno apresentava um grande declive, as duas últimas casas da vila foram construídas com uma pequena estrutura de concreto armado: sapata, pilar, vigas e laje de piso. Para conter o aterro da rua central, na altura dessas últimas casas, fizemos um muro de arrimo de concreto armado. A trabalhosa consolidação do aterro que usamos para manter o nível dos quintais das casas da vila preocupou-me bastante durante muito tempo, a ponto de eu haver tido alguns pesadelos. Aliás, creio ser oportuno dizer que a preocupação com a segurança da execução dos cálculos estruturais que realizei, bem como as dificuldades inerentes que ocorrem na construção civil, associados com a minha hipocondria neurótica acima referida, levaram-me a abandonar a minha carreira de profissional liberal, em 1965, quando fui para a UnB, segundo registrado anteriormente. Esse abandono e suas conseqüências  já estão descritos em alguns artigos desta crônica de minha vida.

Creio que a postura ética com a qual eu e o Moisés conduzimos a construção dessas casas [recordo-me de que o Sr. Raimundo Fidalgo (recentemente falecido), filho do dono da Estância Nove de Janeiro, Antonio Fidalgo, onde comprávamos todo o material para essa construção, ofereceu-nos uma percentagem do valor dessa compra e que decidimos que deveria ser abatida nas faturas do Sr. Alfredo, pois já recebíamos dele para realizar o referido serviço] foi o motivo para que o Seu Alfredo (como o chamo até hoje em nossas reuniões semanais, aos sábados de manhã, na casa de nosso amigo comum João Rodrigues Fernandes, na Rua Boaventura da Silva, 55) nos indicasse para a construção de mais duas vilas de casas. Uma delas, de 24 casas, na Travessa Castelo Branco, próximo da Rua Gentil Bittencourt, de propriedade de seu irmão Eduardo José Salame. A outra, na Praça Amazonas, de propriedade de seu amigo Orlando José Alves. Aliás, creio ser oportuno dizer que, como antecipação de nosso pagamento, o Seu Alfredo nos possibilitou a compra de um carro da marca Vanguard, de seu primo, o médico Jorge Antonio da Silva. As peripécias com esse carro estão contadas em outro artigo dessa minha saga de vida. Também como antecipação de meus honorários, o Seu Alfredo comprou um terreno para mim, localizado na Avenida Serzedelo Correa, em uma vila próximo da Travessa Pariquis. Eu cheguei a fazer o projeto de uma casa, de dois pavimentos, onde pretendia morar com a minha futura família. Nessa época, eu ainda estava noivo da Célia. Contudo, minha troca da Engenharia Civil pela Física, o que motivou  minhas  viagens para Brasília (1965) e São Paulo (1968), sem a família, fizeram com que a Célia e meus filhos, Jô e Ádria, morassem com os meus sogros (Seu Machado e Dona Celina). Na minha volta para Belém, em julho de 1969, decidimos, Célia e eu, morar definitivamente com eles. Em vista disso, presenteamos com esse terreno a Dona Celina. Registro que moramos com eles até suas mortes: Dona Celina, em 29 de abril de 1990, e Seu Machado, em 23 de novembro de 2001.

Voltemos à construção dessas duas novas vilas de casas. A de 24 casas, na Castelo, era do mesmo estilo das 12 casas na Caripunas, ou seja, uma rua central, com 12 casas de cada lado. As duas da frente são de dois andares, e as dez (10) restantes, de um andar. Como o terreno era plano, não houve necessidade de aterro. Essa construção tinha o Oscarino Pinheiro como o Mestre de Obras.

Foi na construção da vila de cinco (5) casas, todas de dois pavimentos, na Praça Amazonas, que aprendi uma lição de Engenharia-Física. Como o terreno era de piçarra, havia uma certa dificuldade para escavar a rede de esgotos fecais. Devido a isso, virei-me para o encanador, um espanhol de nome Justino, que aprendera sua profissão na Espanha e que estava fazendo o serviço, e pedi-lhe que usasse a menor inclinação possível, devido àquela dificuldade. Aí, ele me disse: Doutor Bassalo, a inclinação da tubulação deve ser de tal modo que a parte líquida carregue a parte sólida, pois, se ela for muito inclinada, só escoa a parte líquida, e se for pouco inclinada, não há escoamento. Aí eu percebi que ele usara um princípio físico, o mesmo usado na inclinação de telhados. Esse princípio decorre do  mínimo ângulo de inclinação que um plano inclinado deve ter, para que um corpo inicie seu movimento sobre ele, levando em consideração o atrito. Essa era uma aplicação prática do tipo de exercício que eu resolvia como professor de Física no Colégio “Abraham Levy” e no Colégio Estadual “Paes de Carvalho”.

Ainda com o Moisés, realizei outras construções, como as reformas das casas de moradia do Seu Alfredo (Travessa Quintino Bocaiúva próximo da Avenida Governador José Malcher) e a do Seu Eduardo (Travessa 14 de Março próximo da Avenida Independência, hoje Governador Magalhães Barata), e um prédio comercial da Firma Abreu & Duarte, na Rua O´ de Almeida, ao lado do prédio dos Correios e Telégrafos.

Isoladamente, construí mais cinco (5) casas. Uma residência de dois pavimentos (na qual usei fundação do tipo “radier”), na Travessa Quintino Bocaiúva, próximo da Avenida Conselheiro Furtado, e uma residência de um pavimento (esta estaqueada pela firma de meu amigo Durval Pinheiro), na Passagem Euclides da Cunha, entre aquela Avenida e a Travessa Mundurucus, ambas de propriedade de meu estimado amigo João Rodrigues Fernandes. Ainda nessa passagem, construí uma residência de um andar para o cunhado de meu saudoso amigo Irawaldyr Rocha, o Senhor Neocles Kós Miranda, marido de sua irmã Iracema. Por fim, as duas restantes foram: uma casa de um pavimento na Travessa Apinagés, próximo da Travessa Mundurucus, de propriedade do Egídio Crispino, irmão de meu cunhado Pedro Crispino, e a outra, esta de dois andares, na Travessa Djalma Dutra, próximo da Rua Professor Nelson Ribeiro, de propriedade de meu saudoso e estimado amigo Dr. Adriano Guimarães.

Na conclusão deste relato sobre a minha vida como engenheiro civil, gostaria de destacar um fato marcante ocorrido por ocasião da construção da casa da irmã do Irawaldyr, a Sra. Iracema Kós. Para a sua execução, eu preparei o projeto completo para essa construção: arquitetura, estrutural, elétrico e hidráulico. Em passant, registro que, nessa época, eu ainda não havia decidido abandonar a Engenharia Civil e pensava montar um Escritório de Engenharia que realizasse o projeto completo de residências, como o referido acima. Cheguei a discutir com os meus estimados amigos Affonso e Lindolfo, no DMER, sobre a viabilidade dessa idéia. Vejamos o fato referido acima. O projeto estrutural dessa casa era composto de uma estrutura de concreto armado, com cintas apoiadas em blocos sobre estacas (estas foram cravadas pela firma dos engenheiros Francisco de Assis Coelho Dutra e Luís Alberto Pena de Carvalho), e com laje de forro.

Quando preparávamos as formas da laje de forro para receber o concreto, fiz uma viagem rápida ao Rio de Janeiro e, aproveitando essa oportunidade, pedi ao meu irmão Mário (médico e residente nessa cidade), que me levasse a um psiquiatra para ver a minha hipocondria neurótica. Seu consultório ficava em um prédio em Copacabana, no mesmo andar no qual ficava o escritório do famoso colunista social Ibraim Sued. Lembro-me disso, pois, quando estava aguardando a hora de minha consulta, andei um pouco no corredor e, ao olhar para o interior de uma sala, vi um grande retrato desse colunista apertando a mão do Presidente John Kennedy. Um pouco antes de entrar no consultório do psiquiatra, o Ibraim passou pela porta da sala de espera. Como resultado da consulta, o psiquiatra (de cujo nome, infelizmente, não recordo) indicou-me tomar Kiatrium 10. Como viajaria no dia seguinte para Belém, resolvi iniciar o tratamento só quando chegasse na minha casa. No dia seguinte em que havia tomado a primeira cápsula desse psicotrópico, fui a essa obra e acertei com o Mestre de Obras, o Oscarino Pinheiro, alguns detalhes sobre o escoramento da laje de forro da cozinha da casa, pois iríamos iniciar a concretagem nesse dia. Ao acordar no dia seguinte, eu não sabia o que acontecera no dia anterior, se o que me lembrava era produto de sonho ou de realidade. Só me dei conta de que era realidade quando, ao chegar na obra, o Oscarino veio falar-me e perguntou o que havia acontecido comigo no dia anterior, pois ele me achou bastante estranho.

No fecho deste artigo, registro que a minha crise nervosa foi agravada, quando houve recalque das estacas no lado direito da sala dessa casa. Felizmente, o Dutra e o Luís conseguiram estancar o recalque. Mas, a minha neurose não. Certamente, esse incidente e outros relacionados com o exercício da Engenharia Civil/Estrutural, já registrados em alguns artigos dessas minhas Memórias, ajudaram a tomar a decisão de tornar-me um professor-pesquisador Universitário.